segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Como se divide a Filosofia

As inúmeras atividades a que nos dedicamos cotidianamente pressupõem a aceitação de diversas crenças e valores de que nem sempre estamos cientes. Acreditamos habitar um mundo constituído de diferentes objetos, de diversos tamanhos e diversas cores; acreditamos que esse mundo organiza-se num espaço tridimensional e que o tempo segue a sua marcha inexorável numa única direção. Acreditamos que as pessoas ao redor são em tudo semelhantes a nós, veem as mesmas coisas, têm os mesmos sentimentos e sensações e as mesmas necessidades. Buscamos interagir com outras pessoas, e encontrar alguém com quem compartilhar a vida e, talvez, constituir família, pois tudo nos leva a crer que essa é uma das condições para a nossa felicidade. Periodicamente reclamamos de abusos na televisão, em propagandas e noticiários, na crença de que há certos valores que estão sendo transgredidos por puro sensacionalismo. Em todos esses casos, nossas crenças e valores determinam nossas ações e atitudes sem que eles sequer nos passem pela cabeça. Mas eles estão lá, profundamente arraigados e extremamente influentes. Enquanto estamos ocupados em trabalhar, pagar as contas ou divertir-nos, não vemos necessidade de questionar essas crenças e valores. Mas nada impede que, em determinado momento, façamos uma reflexão profunda sobre o significado desses valores e crenças fundamentais e sobre a sua consistência. É nesse estado de espírito que formularemos perguntas como: “O que é a realidade em si mesma?”, “O que há por trás daquilo que vejo, ouço e toco?”, “O que é o espaço? E o que é o tempo?”, “Se o que aconteceu há um centésimo de segundo atrás já é passado, será que o presente não é uma ficção?”, “Será que tudo o que acontece é sempre antecedido por causas?”, “O que é a felicidade? E como alcançá-la?”, “O que é o certo e o errado?”, “O que é a liberdade?”.
Essas perguntas são tipicamente filosóficas e refletem algo que poderíamos chamar de atitude filosófica perante o mundo e perante nós mesmos. É a atitude de nos voltarmos para as nossas crenças mais fundamentais e esforçar-nos por compreendê-las, avaliá-las e justificá-las. Muitas delas parecem ser tão óbvias que ninguém em sã consciência tentaria sinceramente questioná-las. Poucos colocariam em questão máximas como “Matar é errado”, “A democracia é melhor que a ditadura”, “A liberdade de expressão e de opinião é um valor indispensável”. Mas, a atitude filosófica não reconhece domínios fechados à investigação. Mesmo em relação a crenças e valores que consideramos absolutamente inegociáveis, a proposta da filosofia é a de submetê-los ao exame crítico, racional e argumentativo, de modo que a nossa adesão seja restabelecida em novo patamar. Em outras palavras, a proposta filosófica é a de que, se é para sustentarmos certas crenças e valores, que sejam sustentados de maneira crítica e refletida.
Muitos autores identificam essa atitude filosófica com uma espécie de habilidade ou capacidade de se admirar com as coisas, por mais prosaicas que sejam. Na base da filosofia, estaria a curiosidade típica das crianças ou dos que não se contentam com respostas prontas. Platão, um dos pais fundadores da filosofia ocidental, afirmava que o sentimento de assombro ou admiração está na origem do pensamento filosófico:
"A admiração é a verdadeira característica do filósofo. Não tem outra origem a filosofia."
Platão, Teeteto.[1]
Na mesma linha, afirmava Aristóteles:
"Os homens começam e sempre começaram a filosofar movidos pela admiração."
Aristóteles, Metafísica, I 2.[2]
Embora essa capacidade de admirar-se com a realidade possa estar na origem do pensamento filosófico, isso não significa que tal admiração provoque apenas e tão somente filosofia. O sentimento religioso, por exemplo, pode igualmente surgir dessa disposição: a aparente perfeição da natureza, as sincronias dos processos naturais, a complexidade dos seres vivos podem causar profunda impressão no indivíduo e levá-lo a indagar se o responsável por tudo isso não seria uma Inteligência Superior. Uma paisagem que a todos parecesse comum e sem atrativos poderia atrair de modo singular o olho do artista e fazê-lo criar uma obra de arte que revelasse nuances que escaparam ao olhar comum. Analogamente, embora a queda de objetos seja um fenômeno corriqueiro, se nenhum cientista tivesse considerado esse fenômeno surpreendente ou digno de nota, não saberíamos nada a respeito da gravidade. Esses exemplos sugerem que, além de certa atitude em relação à nossa experiência da realidade, há um modo de interpelar a realidade e nossas crenças a seu respeito que diferenciariam essa investigação da religião, da arte e da ciência.
Ao contrário da religião, que se estabelece entre outras coisas sobre textos sagrados e sobre a tradição, a filosofia recorre apenas à razão para estabelecer certas teses e refutar outras. Como já mencionado acima a filosofia não admite dogmas. Não há, em princípio, crenças que não estejam sujeitas ao exame crítico da filosofia. Disso não decorre um conflito irreconciliável entre a filosofia e a religião. Há filósofos que argumentam em favor de teses caras às religiões, como, por exemplo, a existência de Deus e a imortalidade da alma. Mas um argumento propriamente filosófico em favor da imortalidade da alma apresentará como garantias apenas as suas próprias razões: ele apelará somente ao assentimento racional, jamais à ou à obediência.[3]
Os artistas assemelham-se aos filósofos em sua tentativa de desbanalizar a nossa experiência do mundo e alcançar assim uma compreensão mais profunda de nós mesmos e das coisas que nos cercam. Mas a forma em que apresentam seus resultados é bastante diferente. Os artistas recorrem à percepção direta e à intuição[4]; enquanto a filosofia tipicamente apresenta seus resultados de maneira argumentativa, lógica e abstrata.
Mas, se essa insistência na razão diferencia a filosofia da religião e da arte, o que a diferenciaria das ciências, uma vez que também essa privilegia uma abordagem metódica e racional dos fenômenos? A diferença é que os problemas tipicamente filosóficos não podem ser resolvidos por observação e experimentação[5]. Não há experimentos e observações empíricas que possam decidir qual seria a noção de “direitos humanos” mais adequada do ponto de vista da razão. O mesmo vale para outras noções, tais como “liberdade”, “justiça” ou “falta moral”. Não há como resolver em laboratório questões como: “quando tem início o ser humano?”, “os animais podem ser sujeitos de direitos?”, “em que medida o Estado pode interferir na vida dos cidadãos?”, “As entidades microscópicas postuladas pelas ciências têm o mesmo grau de realidade que os objetos da nossa experiência cotidiana (pessoas, animais, mesas, cadeiras, etc.)?”. Em resumo, quando um tópico é defendido ou criticado com argumentos racionais, e essa defesa ou ataque não pode contar com observações e experimentos para a sua solução, estamos diante de um debate filosófico.

 

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Jean Baudrillard (Reims, 27 de julho de 1929 — Paris, 6 de março de 2007) foi um sociólogo e filósofo francês. 
     Vida  
Enfrentou uma época bastante conturbada em seu país, como a depressão da década de 1930. Sua biografia é de difícil acesso, tanto pela inexistência de documentos sobre ele, quanto por sua personalidade reservada, pois resguardava exageradamente sua privacidade.
Sociólogo, poeta e fotógrafo, este personagem polêmico desenvolve uma série de teorias que remetem ao estudo dos impactos da comunicação e das mídias na sociedade e na cultura contemporâneas. Partindo do princípio de uma realidade construída (hiper-realidade), o autor discute a estrutura do processo em que a cultura de massa produz esta realidade virtual.
Suas teorias, contradizem o discurso da "verdade absoluta" e contribuem para o questionamento da situação de dominação imposta pelos complexos e contemporâneos sistemas de signos. Os impactos do desenvolvimento da tecnologia e a abstração das representações dos discursos são outros fenômenos que servem de objecto para os seus estudos. Sua postura profética e apocalíptica é fundamentada através de teorias irônicas que têm como objectivo o desenvolvimento de hipóteses e polêmicas sobre questões actuais e que refletem sobre a definição do papel que o homem ocupa neste ambiente.
Para Baudrillard, o sistema tecnológico desenvolvido deve estar inserido num plano capaz de suportar esta expansão contínua. Ressalta que as redes geram uma quantidade de informações que ultrapassam limites a ponto de influenciar na definição da massa crítica. Todo o ambiente está contaminado pela intoxicação midiática que sustenta este sistema. A dependência deste “feudalismo tecnológico” faz-se necessária para que a relação com dinheiro, os produtos e as idéias se estabeleça de forma plena. Esta é a servidão voluntária resultante de um sistema que se movimenta num processo espiral contínuo de auto-sustentação.
A interactividade permite a integração de elementos que antes se encontravam separados. Este fenómeno cria distúrbios na percepção da distância e na definição de um juízo de valor. As partes envolvidas encontram-se tão ligadas que inibem a representação das diferenças transmitida por elas. A máquina representa o homem que se torna um elemento virtual deste sistema. As representações são simuladas num ambiente de redes que fornecem uma ilusão de informações e descobertas. Tudo é previamente estabelecido: “O sistema gira deste modo, sem fim e sem finalidade”, diz o autor. Devido à sociedade tecnocrática e ao poder dominador dos meios de comunicação, a vida humana acaba se tornando uma "realidade virtual".
Como poeta e fotógrafo, desenvolve, em paralelo ao seu trabalho teórico, intensa atividade artística, com inúmeras exposições pela França e pelo mundo.
Baudrillard consolidou a fama em 1991, com a provocação de que a Guerra do Golfo "não ocorreu", argumentando que nenhum lado poderia cantar vitória e que o conflito não alterou nada no Iraque. Dez anos depois, no ensaio "O Espírito do Terrorismo", voltou a causar controvérsia, ao descrever os ataques de 11 de Setembro de 2001 nos E.U.A. como expressão da "globalização triunfante combatendo a si mesma". Sobre o episódio, escreveu no ano seguinte Réquiem para as Torres Gémeas.
A imagem fotográfica afasta ou atrai a população da realidade? A questão foi levantada por Baudrillard em São Paulo, em 2000, num seminário sobre imagem e violência. Ajudou a inspirar os irmãos Wachowski na trilogia de Matrix

nome:Felipe Dumont,Lucas O. ,Lucas E. ,Abílio,Washington e David
Tutma:2001










John Locke
Sobre a linha do desenvolvimento do empirismo, Locke representa um progresso em confronto com os precedentes: no sentido de que a sua gnosiologia fenomenista-empirista não é dogmaticamente acompanhada de uma metafísica mais ou menos materialista. Limita-se a nos oferecer, filosoficamente, uma teoria do conhecimento, mesmo aceitando a metafísica tradicional, e do senso comum pelo que concerne a Deus, à alma, à moral e à religião. Com relação à religião natural, não muito diferente do deísmo abstrato da época; o poder político tem o direito de impor essa religião, porquanto é baseada na razão. Locke professa a tolerância e o respeito às religiões particulares, históricas, positivas.
Locke viajou fora da Inglaterra, especialmente em França, onde ampliou o seu horizonte cultural, entrou em contato com movimentos filosóficos diversos, em especial com o racionalismo. Tornou-se mais consciente do seu empirismo, que procurou completar com elementos racionalistas (o que, entretanto, representa um desvio na linha do desenvolvimento do empirismo, procedente de Bacon até Hume).
Vida e Obras
João Locke nasceu em Wrington, em 1632. Estudou na Universidade de Oxford filosofia, ciências naturais e medicina. Em 1665 foi enviado para Brandenburgo como secretário de legação. Passou, em seguida, ao serviço de Loed Ashley, futuro conde de Shaftesbury, a quem ficou fiel também nas desgraças políticas. Foi, portanto, para a França, onde conheceu as personalidades mais destacadas da cultura francesa do "grand siècle". Em 1683 refugiou-se na Holanda, aí participando no movimento político que levou ao trono da Inglaterra Guilherme de Orange. De volta à pátria, recusou o cargo de embaixador e dedicou-se inteiramente aos estudos filosóficos, morais, políticos. Passou seus últimos anos de vida no castelo de Oates (Essex), junto de Sir Francisco Masham. Faleceu em 1704.
Tratado do Governo Civil(1689); o Ensaio sobre o Intelecto Humano(1690); os Pensamentos sobre a Educação(1693). As dontes principais do pensamento de Locke são: o nominalismo escolástico, cujo centro famoso era Oxford; o empirismo inglês da época; o racionalismo cartesiano e a filosofia de Malebranche.
As suas obras filosóficas mais notáveis são: o

O Pensamento: A Gnosiologia
gnosiologia, para achar um critério de verdade. Podemos dizer que a sua filosofia se limita a este problema gnosiológico, para logo passar a uma filosofia moral (e política, pedagógica, religiosa), sem uma adequada e intermédia metafísica.
Locke julga, como Bacon, que o fim da filosofia é prático. Entretanto - diversamente de Bacon, que julgava fim da filosofia o conhecimento da natureza para dominá-la (fim econômico) - Locke pensa que o fim da filosofia é essencialmente moral; quer dizer: a filosofia deve proporcionar uma norma racional para a vida do homem. E, como os seus predecessores empiristas, ele sente, antes de mais nada, a necessidade de instituir uma investigação sobre o conhecimento humano, elaborar uma
idéias(no sentido genérico das representações): qual é a sua origem e o seu valor? Locke exclui absolutamente as idéias e os princípios que deles se formam, derivam da experiência; antes da experiência o espírito é como uma folha em branco, uma tabula rasa.
Locke não parte, realisticamente, do ser, e sim, fenomenisticamente, do pensamento. No nosso pensamento acham-se apenas
sensação, e nos proporciona a representação dos objetos (chamados) externos: cores, sons, odores, sabores, extensão, forma, movimento, etc. A segunda realiza-se através dareflexão, que nos proporciona a representação das próprias operações exercidas pelo espírito sobre os objetos da sensação, como: conhecer, crer, lembrar, duvidar, querer, etc. Nas idéias proporcionadas pela sensibilidade externa, Locke distingue as qualidades primárias, absolutamente objetivas, e as qualidades secundárias, subjetivas(objetivas apenas em sua causa).
No entanto, a experiência é dúplice: externa e interna. A primeira realiza-se através da
simplese idéias complexas, que são uma combinação das primeiras. Perante as idéias simples - que constituem o material primitivo e fundamental do conhecimento - o espírito é puramente passivo; pelo contrário, é ele ativo na formação das idéias complexas. Entre estas últimas, a mais importante é a substância: que nada mais seria que uma coleção constante de idéias simples, referida pelo espírito a um misterioso substrato unificador. O espírito é também ativo nas sínteses que são as idéias de relação, e nas análises que são as idéias gerais. Às idéias de ralação pertencem as relações temporais e espaciais e de idéias simples dos complexos a que pertencem e da universalização da idéia assim isolada, obtendo-se, desse modo, a idéia abstrata (por exemplo, a brancura). Locke é, mais ou menos, nominalista: existem, propriamente, só indivíduos com uma essência individual, e as idéias gerais não passam de nomes, que designam caracteres comuns a muitos indivíduos. Entretanto, os nomes que designam uma idéia abstrata, isto é, uma propriedade semelhante em muitas coisas, têm um valor e um escopo práticos: auxiliar os homens a se conduzirem na vida.
As idéias ou representações dividem-se em idéias

Dado o nominalismo de Locke, compreende-se como, para ele, é impossível a ciência verdadeira da natureza, considerada como conhecimento das leis universais e necessárias. Locke julga também inaplicável à natureza a matemática - reconhecendo-lhe embora o caráter de verdadeira ciência - isto é, não acredita na físico-matemática, à maneira de Galileu. Entretanto, mesmo que a ciência da natureza não nos desse senão a probabilidade, a opinião, seria útil enquanto prática.
intuitivoe demonstrativo. No primeiro caso a relação é colhida intuitiva, imediata e evidentemente. Por exemplo: 3 = 2 + 1. No segundo caso a relação é colhida mediatamente, recorrendo às idéias intermediárias, ao raciocínio. Por exemplo: a existência de Deus demonstrada pela nossa existência e pelo princípio de causalidade. Naturalmente, a demonstração é inferior à intuição.
Até aqui foram analisados e descritos os conteúdos de consciência. É mister agora propor a questão do seu valor lógico. Costuma-se dizer que as idéias são "verdadeiras ou falsas"; melhor seria chamá-las "justas ou erradas", porque, propriamente, "a verdade e a falsidade pertencem às proposições", em que se afirma ou se nega uma relação entre duas idéias. E esta relação, afirmada ou negada, pode ser precisamente falsa ou verdadeira. O conhecimento da relação positiva ou negativa entre as idéias é, segundo Locke, de dois tipos:

Idéias Metafísicas

Estamos, porém, ainda fechados no mundo subjetivo, fenomênico; de fato, tratou-se, até agora, de relações positivas ou negativas, concordes ou desacordes com as idéias. Podemos nós sair desse mundo subjetivo e atingir o mundo objetivo, isto é, podemos conhecê-lo imediatamente ou mediatamente na sua existência e na sua natureza? Locke afirma-o, sem mostrar, entretanto, como este conhecimento do mundo externo possa concordar com a sua geral (fenomenista) concepção e definição do conhecimento. É a sólita posição de um fenomenismo ainda não plenamente consciente de si mesmo. Corta as relações com o ser e vai para o fenomenismo absoluto, mas tem ainda saudade desse ser do qual se isolou.
nosso serseria intuitivamentepercebido através da reflexão. A existência de Deusseria racionalmente demonstradamediante o princípio de causa, partindo do conhecimento imediato de uma outra existência (a nossa). A existência das coisas, alfim, seria sentidainvencivelmente, porque nos sentimos passivosem nossas sensações, que deveriam ser causadas por seres externos a nós.
Em todo caso, Locke acredita poder atingir, antes de tudo, o nosso ser, depois o de Deus, e, finalmente, o das coisas. O

Entretanto, pelo que diz respeito ao nosso ser, é mister ter presente que nós não conhecemos intuitivamente a substância da alma, e sim as suas atividades. Pelo que diz respeito a Deus, a prova da sua existência vale, se vale absolutamente o princípio de causa - o que Locke não demonstrou. Enfim, pelo que diz respeito às coisas externas, mesmo admitida a prova aduzida por Locke - segundo a confissão do próprio filósofo - tal prova vale apenas pelo que concerne à existência das coisas, e não pelo que concerne à natureza delas. De fato, segundo a filosofia de Locke, não sabemos se as idéias da natureza das coisas correspondem à realidade das coisas.

Moral e Política
moral, todavia, é muito mais intelectualista do que empirista, pois ele lhe reconhece o caráter de verdadeira ciência, universal e necessária.
Locke não admite, naturalmente, idéias e princípios inatos nem sequer no campo da moral. A sua

Entretanto, não basta ter construído uma moral em abstrato, embora racional. É preciso torná-la praticamente eficaz, isto é, faz-se mister uma obrigação moral, que se imponha à nossa vontade. Ora, visto que é natural, no homem, a tendência para o próprio bem-estar, é natural que ele seja atingido pelas penas, pelas sanções, que precisamente lhe impedem tal realização. Que parte tem a liberdade da vontade em tudo isto? Locke nega, propriamente, o livre arbítrio, porquanto nós nos inclinamos necessariamente para um bem determinado e devemos desejar o bem maior.
política, Locke deriva a lei civil da lei natural, racional, moral, em virtude da qual todos os homens - como seres racionais - são livre iguais, têm direito à vida e à propriedade; e, entretanto na vida política, não podem renunciar a estes direitos, sem renunciar à própria dignidade, à natureza humana. Locke admite um originário estado de natureza antes do estado civilizado. Não, porém, no sentido brutal e egoísta de inimizade universal, como dizia Hobbes; mas em um sentido moral, em virtude do qual cada um sente o dever racional de respeitar nos outros a mesma personalidade que nele se encontra.
Quanto à
Tratado sobre o Governo Civil, é a expressão teórica do constitucionalismo liberal inglês, em contraste com a doutrina do absolutismo naturalista de Hobbes.
Também Locke admite a passagem do estado de natureza ao estado civilizado, porquanto, no primeiro, falta a certeza e a regularidade da defesa e da punição, que existe no segundo, graças à autoridade do superior. Entretanto, estipulando este contrato social, os indivíduos não renunciam a todos os direitos, porquanto os direitos que constituem a natureza humana (vida, liberdade, bens), são inalienáveis; mas renunciam unicamente ao direito de defesa e de fazer justiça, para conseguir que os direitos inalienáveis sejam melhor garantidos. Antes, se o estado violasse esses direitos inalienáveis, os indivíduos teriam o direito e o dever de a ele resistir e de se revoltar contra o poder usurpador. A doutrina política de Locke, contida no seu

Idéias Pedagógicas

Com respeito à religião, Locke toma uma atitude racionalista moderada. Admite uma religião natural, exigível também politicamente, porquanto fundamentada na razão. E professa a tolerância a respeito das religiões particulares, históricas, positivas.
problemas pedagógicos, escrevendo os Pensamentos sobre a Educação. Aí afirma a nossa passividade, pois nascemos todos ignorantes e recebemos tudo da experiência; mas, ao mesmo tempo, afirma a nossa parte ativa, enquanto o intelecto constrói a experiência, elaborando as idéias simples.
Locke interessou-se especialmente pelos
ão, que é, necessariamente, autônoma. A formação educacional consiste, portanto, fundamentalmente, no desenvolvimento do intelecto mediante a moral, precisamente pelo fato de que se trata de formar seres conscientes, livres, senhores de si mesmos. Por conseguinte, a educação deve ser formativa, desenvolvendo o intelecto, e não informativa, erudita, mnemônica. Igualmente Locke é fautor de educação física, mas como o meio para o domínio de si mesmo.
Afirma-se que todos nascemos iguais, dotados de razão; mas, ao mesmo tempo, todos temos temperamentos diferentes, que devem ser desenvolvidos de conformidade com o temperamento de cada um. Esta educação individual não exclui, mas implica a educação, a formação social, para ampliar, enriquecer a própria personalidade. Tem muita importância a obra do educador, mas é fundamental a colaboração do discípulo, pois trata-se da formação do intelecto, da raz



u  Thomas hobbes

A palavra constante é importante nesse contexto dado que o movimento externo, ou seja, tudo o que afeta o homem e que está fora dele e é ror ele através da sens ibilidade, pode ser mudado. Quando se processa tal mudança, mudará também o movimento pr
opensamento de Hobbes se coloca em evidência na história da filosofia como uma teoria de caráter profundamente racionalista. Devedor das idéias de seu tempo, ele constrói uma teoria que traz consigo aspectos marcantes de sua época tais como o racionalismo, um forte apego à geometria, ao método dedutivo, à física de Galileu etc. Em sua obra, podemos notar também a presença dos ideais filosóficos políticos que surgem no bojo do período moderno, tais como o pensamento elaborado pelo francês Jean Bodin, o inglês Tomas Morus, Hugo Grócio, Maquiavel, entre outros, que já no século XVI, surgiam com grande apelo.
Hobbes edifica, desta forma, uma teoria do Estado que possuirá suas bases fundadas em alguns dos aspectos salientados por esses autores. Deste modo, buscará elaborar um modelo mecanicista e materialista que possa dar conta de uma construção que abarque “todo o lugar no homem”.
Nesse trabalho, buscaremos, no entanto, enfatizar não o aspecto precisamente político-jurídico de suas obras, ao menos não diretamente, mas teremos sim, como eixo central, o objetivo de investigar outro aspecto da construção do homem, a saber, as paixões. Por conseqüência, indiretamente, abordaremos em alguns momentos questões de relevância para o modelo de Estado proposto por Hobbes, isto é, enfatizaremos a presença das paixões no homem, e a partir daí, suas implicações na formação do Estado civil.
O modelo de homem tal como entendido por Hobbes, assemelha-se á uma máquina, cujo funcionamento resulta de um encadeamento gerado a partir da incidência de movimentos externos (agente) que provocam movimentos internos (paciente). Nesse sentido, é que podemos entender a caracterização exposta acima de que o mecanicismo ocupa um lugar central no estudo da composição humana (antropologicamente falando).
Entretanto, antes de nos determos nesse processo de formação das paixões se faz necessário alguns esclarecimentos.
É através da sensibilidade que o homem obtém conhecimento acerca de tudo o que lhe cerca. A sensação é trabalhada como uma “ilusão originária, causada pela pressão, isto é, pelo movimento das coisas exteriores nos nossos olhos, ouvidos e outros órgãos a isso determinados” (HOBBES, 1983).
Através da sensação é que conseguimos entender o que chamamos movimentos internos e movimentos externos. Porém, para esclarecer esses dois termos citados (movimentos internos/ movimentos externos) é necessário antes nos remetermos ao que vem a ser movimento.
Para tentar elucidar a questão buscaremos auxílio nos escritos de Hobbes que caracterizam sua Filosofia primeira, ou seja, aquela que explica a realidade última da natureza humana.
De início, Hobbes mostra como que mesmo enfrentando um problema semelhante ao discutido por Descartes, ou seja, o problema da origem do conhecimento ou da forma com que podemos apreender algo, sua resolução não caminhará nos mesmos trilhos da resposta proposta pelo autor das Meditações Metafísicas. Hobbes mostrará que o conhecimento da proposição cartesiana “eu existo” depende realmente da proposição “eu penso” contudo questiona ainda, de onde viria essa última. E sua resposta não recorre ao dualismo ontológico entre substância extensa corpórea e substância espiritual pensante como faz Descartes quando diz:
de um lado, tenho uma idéia clara e distinta de mim mesmo, na medida em que sou apenas uma coisa pensante e inextensa, e que, de outro, tenho uma idéia distinta do corpo, na medida em que é apenas uma coisa extensa e que não pensa, é certo que este eu, isto é, minha alma, pela qual eu sou o que sou, é inteira e verdadeiramente distinta de meu corpo e que ela pode ser ou existir sem ele. (DESCARTES, 1973)
De acordo com o que Descartes afirma, podemos trabalhar em dois planos distintos. O primeiro, da substância corpórea e o segundo, da substância pensante, a primeira extensa e a segunda espiritual.
Hobbes, por sua vez, aborda a mesma problemática, porém não fazendo a mesma distinção de Descartes, ou seja, não recorre ao dualismo ontológico cartesiano, e nos mostra que não podemos conceber qualquer pensamento sem uma coisa que pense, uma vez que a origem de todo pensamento está diretamente ligada a “aquilo que denominamos sensação (pois não há nenhuma concepção no espírito do homem, que primeiro não tenha sido originada, total ou parcialmente, nos órgãos dos sentidos” (HOBBES ,1983).
Desta forma, podemos observar como Hobbes enfatiza a idéia de que o sujeito de um pensamento será sempre um sujeito corporal. Assim, tanto os sujeitos como os objetos, serão corpos, e desta forma, Hobbes “corajosamente reduz toda a realidade a um conjunto de corpos em movimento” (MARGUTTI, 1988).
Portanto, podemos assentar duas questões básicas no que tange a essa primeira argumentação, quais sejam:
Primeiro: Hobbes desenvolverá sua análise do homem baseando-se em princípios mecânicos.
Segundo: ele não recorrerá a uma noção materialista dualista entre corpo e espírito, isto é, em linguagem cartesiana, ele não fará a distinção entre res-cogita e res-extensa.
Bem, ao partirmos dessas duas constatações básicas, podemos dizer que o homem hobbesiano é sim resultado de um princípio de causalidade mecânica, de modo que, é através de movimentos recebidos através da sensibilidade que teremos as paixões. E é através desse princípio de causalidade mecânico-empírica, que derivarão todas as “paixões humanas” como a alegria, tristeza, ódio, vingança, medo, esperança, etc.
Portanto, de início temos que “as paixões humanas” são resultantes da ação de corpos externos (agente) que causam movimentos internos em outros corpos (paciente). O agente “é o corpo que, ao empurrar um outro, gera movimento neste último” e paciente “é o corpo que, ao ser empurrado por um outro recebe movimento deste último” (MARGUTTI, 1988). No entanto, o processo que viabiliza as paixões não é assim tão simples, isto é, não é causado apenas por uma relação de ação e reação. Esse movimento de ação e reação de corpos externos em corpos internos, não dá conta do que realmente ocorre no âmbito das paixões humanas do ponto de vista de sua formação. Acerca dessa relação, poderíamos dizer que ela é apenas um efeito do que se processa no homem, isto é, um segundo momento que propicia a ocorrência das paixões. Antes dessa interação agente/paciente, há uma força que atua no interior do homem e que é a grande responsável pela forma com que as paixões se formam.
Essa força será um movimento primeiro que se processará no interior da mente, que por uma série de transmissões, culminará na realização do movimento corporal. Aqui estamos bem no centro da teoria hobbesiana das paixões.
Esse movimento se processa no interior do homem e precede a relação de afecção entre os movimentos externos/internos, e ainda por sua vez, é a origem interna dos movimentos externos. Ele se manifesta como um movimento original primeiro, interno e microscópico que se inicia no interior do corpo antes de se manifestar de forma definitiva em ações externas. E é o que Hobbes denomina esforço.
Mesmo que os homens não tenham conhecimento desses pequenos movimentos, eles existem, e estão nos “inícios do movimento, no interior do corpo do homem, antes de se manifestarem no andar, na fala, na luta e outras ações visíveis” (HOBBES, 1983). Esse movimento é comumente chamado “conatus” e aparece no original inglês do De Corpore como endeavour.
Busquemos esclarecer o que de fato foi dito até aqui.
O complexo modelo científico materialista-empirista de Hobbes nos leva a algumas conclusões que coloca o autor dentro de uma tradição que nos remonta a Galileu e a Bacon. Ao primeiro, é devedor da concepção de física do movimento que conduz seu pensamento, e do segundo, Hobbes recebe toda teoria do racionalismo radical que atravessará os séculos e que perdurará em suas bases mais fundamentais até os dias de hoje.
Dentro dessa concepção que situa Hobbes como herdeiro de Bacon e Galileu existe algo que tem como base um dado empírico, e que é de primordial relevância para explicarmos o complexo aparato passional humano, esse algo é o que já mencionamos como “conatus”.
Sabemos que as paixões humanas são caracterizadas de acordo com aquilo que lhe é externo, ou seja, determinada atitude será vista como uma má atitude na medida do tipo de conseqüência que ela trará ao sujeito que a praticou. Assim, se entre dois homens existir uma desconfiança recíproca, e um deles, num golpe, tirar a vida do outro, essa atitude será benéfica para aquele que desferiu o golpe, podendo reclamá-la como boa. Isso mostra o quão relativista é a teoria das paixões, e está na trilha do que Hobbes diz no capitulo VI do Leviatã, ou seja, que não há lei do certo ou do errado enquanto não houver Estado.[1][1]
Desse modo, podemos observar que o bem e o mal só podem ser medidos de acordo com a conseqüência que cada ação provoca num determinado indivíduo, sendo que o que pode significar o bem de um pode também ser o mal de outro, e ainda, o que é bom hoje pode não o ser amanhã. A partir dessas definições devemos caracterizar todas as paixões humanas tais como justiça, felicidade, amor, etc. Assim também o conatus (endeavour) é gerado nos homens a partir da sensação produzida por um objeto. Quando um determinado objeto consegue afetar os homens, ou melhor, provocar neles um esforço no sentido de tentar alcançá-lo, Hobbes chama esse impulso de “desejo”. Quando esse esforço se dá no sentido de afastar o objeto recebe o nome de “aversão”. Em suma, desejo e aversão significam movimentos, um de aproximação outro de afastamento, sempre em relação aos objetos que afetam os homens. A imobilidade diante desses objetos, ou seja, a indiferença, é o que ele chama de “desprezo” (HOBBES, 1983).
A teoria das paixões elaborada por Hobbes é concebida sempre em pares, isto é, o mesmo movimento que causa o amor causa também o ódio, e a diferença existente entre amor e ódio reside, única e exclusivamente, na conseqüência que essas geram em cada indivíduo. Quando o movimento primário (conatus) causa um efeito positivo, a paixão gerada é o amor, se o efeito causado for negativo, teremos então o ódio.
O conatus, núcleo central que se caracteriza como movimento primeiro, deve ser pensado sempre no vetor sujeito-objeto, como aquilo que se manifesta em direção ao que lhe provoca.
Este esforço quando vai em direção a algo que o causa, chama-se apetite ou desejo, sendo o segundo o nome mais geral , e o primeiro freqüentemente limitado a significar o desejo de alimento...Quando o esforço vai no sentido de evitar alguma coisa  chama-se geralmente aversão (HOBBES, 1983).
Deste modo podemos dizer que o grande fundamento, o motor de todo aparato passional reside no fato elementar do “conatus”, ou seja, no desejo primeiro de se atingir algo. Ele é a pedra que ampara o edifício da constituição e da composição humana do ponto de vista de suas paixões. É o movimento que traz para si aquilo que é útil para a conservação do homem, e também à força que repudia, que afasta tudo que possa servir de ameaça a essa conservação.
Aqui poderíamos objetar se o “conatus” seria duas forças: uma que busca os objetos que visam à conservação (apetites), e outra que afasta os objetos que a ameaçam (aversão) aproximando assim, mais uma vez, a filosofia de Hobbes à de Descartes.
A resposta a ser dada, para sermos coerentes com o modelo hobbesiano, parece caminhar no sentido de que essa é uma única força:
Dos apetites e aversões, alguns nascem com o homem, como o apetite pela comida, o apetite de excreção e exoneração (que podem também, e mais propriamente, ser chamados aversões, em relação a algo que se sente dentro do corpo) (HOBBES, 1983).
Dentro da filosofia hobbesiana não há espaço para qualquer tipo de dualismo original como podemos ser levados a pensar. O que de fato há é uma tendência que nos induz a tomar certas atitudes e a repudiar outras, resguardando sempre o mesmo desejo que se manifesta, ora em forma de aproximação, ora em forma de distanciamento, de acordo com a realidade do sujeito, e sempre com a finalidade de saciar o desejo de auto preservação.
O fato de Hobbes trabalhar as paixões sempre em pares contrastantes (amor/ódio, desejo/aversão, medo/esperança) não significa que a origem dessas paixões também seja antagônica, ou seja, que exista um dualismo ontológico. O que ocorre em sua filosofia é uma diferenciação modal, isto é, a dualidade não é original, mas sim uma distinção lógica que possui uma só origem, um só núcleo, que é o esforço (conatus).
No pensamento de Hobbes, as paixões desempenham um papel dúbio, isto é, se por um lado a desconfiança natural, o egoísmo e a competição por poder e mais poder levam o homem a um estado de tensão eminente, por outro lado, o medo de ter sua vida perpetuada nesse estado instável, e a esperança de que se pode sair dele, leva o homem a buscar meios para construir o corpo político.
Hobbes não concebe, como os aristotélicos, que os homens possam ser vistos como zoón politikon, ou seja, que eles vivam naturalmente em sociedade. Segundo ele, ao contrário do que havia se postulado até então, a convivência entre os homens é potencialmente conflituosa, dado que, vivem sob o imperativo de paixões como a desconfiança e o egoísmo, e essas condições necessariamente levam a um estado de tensão eminente. Contudo, para eliminar esse estado, o homem, após uma série de ponderações acerca de sua realidade, trabalha no sentido de construir um aparato jurídico que possa regular a vida comum, e assim não mais viver sob a tutela da pura força. Nesse momento se fará presente a esperança, como uma paixão ativa que atuará de mãos dadas com o medo, anulando-o e possibilitando a crença de que, no Estado civil regido por leis (lex) positivas, o homem não viverá em guerra e a paz poderá ser alcançada.
É derivado da necessidade dos indivíduos celebrarem o pacto, que a esperança se fará presente, auxiliando o homem a sair dessa situação instável, isto é, do estado de guerra. É a essa paixão que nos deteremos nesse trabalho.
Após termos exposto em linhas gerais a formação das paixões, vejamos como uma delas, a saber, a esperança se articula com a formação do Estado Civil.
Quando publica em 1640 a obra A Natureza Humana Hobbes formula um conceito de esperança que contém ao mesmo tempo o que ela é, e o que caminha a seu lado quando a expectativa de futuro propícia dessa paixão é negativa. Assim diz Hobbes:
“A ESPERANÇA é a expectativa de bem futuro, como o medo é expectativa de mal. Mas quando, agindo alternadamente em nossas mentes, há algumas causas que nos fazem ter a expectativa de bem e, se as causas que nos fazem ter a expectativa de bem forem maiores do que as que nos fazem ter a expectativa de mal, a paixão é toda esperança; se ocorre o contrário é medo. A privação absoluta de esperança é DESESPERO, e um grau menor dessa privação é DESALENTO. (HOBBES, 1983)
As características formadoras da filosofia de Hobbes, como foi posto acima, resultam de movimentos voluntários internos que ocorrem no indivíduo. Esses movimentos são classificados em dois tipos: movimento vital e movimento voluntário ou animal.
Movimentos vitais são aqueles que compõem a própria condição de “ser vivo” do homem, circulação do sangue, o pulso, a respiração, a digestão, a nutrição, a excreção etc. Já os movimentos voluntários são aqueles resultantes das sensações externas causadas no interior do indivíduo através do que vemos, ouvimos etc, de onde derivam o nosso “falar, andar ou mover qualquer dos membros da maneira como anteriormente foi imaginada pela mente” (HOBBES, 1983).
Para entender o conceito de esperança, no âmbito em que nos propomos, não será necessário abordar os movimentos vitais, ficaremos então apenas nos movimentos voluntários, que são os causadores dos esforços (endeavour) que são o núcleo de formação das paixões. O esforço pode ser tomado como um “movimento pontual num dado instante” (MARGUTTI, 1998) que quando direcionado a algo que o causa recebe o nome de apetite ou desejo. Porém quando direcionado a evitar algo que possa significar sinal de alguma ocorrência negativa derivada desse movimento, Hobbes o nomeia aversão. Todas as vezes que a palavra “desejo” for mencionada ela estará imbuída de uma significação que buscará salientar a ausência do objeto, o que caracteriza o desejo é sua relação com a busca de algo que ainda não se possui. A aversão, no entanto, se caracteriza por mais um componente, isto é, não só podemos ter um sentimento negativo (ódio) com relação a algo que eu tenha conhecimento, como também referente a algo que não se sabe se pode ou não nos causar dano. Nesse momento mais uma vez nos deteremos apenas aos desejos e apetites, pois deles derivarão a esperança.
O objeto do apetite ou dos desejos dos homens é o que pode ser chamado de “bom”, pois quem julga sobre o que é bom ou ruim quando não há Estado, é o próprio homem. A viabilização do Estado civil através do pacto é o que irá possibilitar um poder (soberano) para decidir sobre o que é justo ou injusto, na medida em que isso será benéfico para a preservação da paz dentro do Estado soberano.
Hobbes não acredita em um “valor intrínseco” de conceitos como a justiça, injustiça, bom, mal, mas sim que isso será arbitrado pelo soberano, quando houver Estado, ou por cada pessoa quando não houver. Desta forma “não há nada que o seja simples e absolutamente, nem há qualquer regra comum do bem ou do mal, que possa ser extraída da natureza dos próprios objetos” (HOBBES, 1983).
O homem, concebido em sua integralidade natural, se vê entregue às mais terríveis possibilidades de guerra, e essa impressão é corroborada graças à memória, pois essa pode remeter a lembranças de possíveis situações de conflitos vividos, e essas lembranças causam, por sua vez, movimentos internos no indivíduo. Esses movimentos, quando aliados a uma crença de que se consiga o que se está almejando, é nomeado “esperança”.
É importante salientar que, no pensamento de Hobbes, a cadeia dedutiva de relações de causa e efeito não estão isentas de uma participação efetiva das paixões, ou seja, elas estarão presentes em todos os atos de deliberação do homem.
Ao serem inclinados pela recta ratio, na direção de realizar o pacto, os indivíduos não o fazem apenas com o intuito de alcançar a paz que não há no estado de natureza. O pacto só pode ser possível, graças a crença que possuem no ato de sua celebração. Essa crença é que anuncia que, a esperança da paz tão desejada poderá vigorar no Estado civil, e através desse Estado, os homens não mais viverão sob a égide do medo que é característico do estado de guerra.
Nesse momento, podemos observar o quanto ás paixões são importantes para Hobbes, pois, não está presente apenas a esperança resultante do desejo de paz que o homem nutre ao ser guiado pela razão[2][2], mas também está presente o medo que caminha lado a lado com a esperança, como já foi dito. Ambos são derivados do desejo de se conquistar algo, quando esse desejo é seguido da expectativa de bem, o chamamos esperança, quando é seguido de uma expectativa de algo negativo, o chamamos medo.
No Leviatã, Hobbes atribui à esperança além da conotação já prescrita no A Natureza Humana uma outra, a saber, ele a compara à confiança, ao dizer que “A esperança constante chama-se confiança em si mesmo” (HOBBES, 1987).
Tal comparação pode ser compreendida na medida em que nos voltarmos, mais uma vez, à obra de 1640, lá Hobbes define confiança como “a paixão que procede da crença de quem tem uma expectativa de bem, ou de quem espera o bem” (HOBBES, 1983).
Ora, a semelhança das definições de esperança dada no Leviatã e de confiança dada no A Natureza Huvocado nos órgãos dos sentidos, que por sua vez, significará a ocorrência de mudanças nas paixões. Essa diversificação acarreta uma transformação no diagnóstico dado pela sensibilidade, e ainda interfere na continuidade das paixões, na medida que elas são efeitos sofridos pelos movimentos internos causados por movimentos externos.
Deste modo, podemos dizer que, é pelo fato da expectativa de bem nomeada “esperança” ser uma expectativa constante que ela pode também ser chamada de confiança. Portanto, a esperança só pode ser tomada confiança na medida de sua constância.
Pelo que foi dito nesse texto, pretendemos ter deixado claro, a relevância que deve ser atribuída ao aparato passional Hobbesiano. Mesmo sabendo de seu forte apego ao racionalismo, sabemos que o que caracteriza o pensamento hobbesiano, não necessariamente caracteriza, como um todo, o homem hobbesiano.
A razão que ampara o pensamento de Hobbes nos leva a concluir que, seu processo investigativo, isto é, seu método, conduz a um diagnóstico da natureza humana que a situa dentro de um sistema altamente influenciado pelas paixões. Nessa perspectiva é que a esperança será um fator de grande importância na construção do Estado civil, pois em parte, é calcado na crença alimentada por ela que os homens se propõe a edificar o constructo racional que é o Estado soberano.
A esperança é parte componente desse processo de passagem Estado de natureza/Estado civil, pois na medida em que é trabalhada pela razão, ela causa no homem o desejo, isto é, “a expectativa de bem futuro”, de instituir o pacto fundante que é o mensageiro da paz entre os homens.
O Estado Civil surgirá também por estar amparado na confiança, que é “a paixão que procede da crença de quem tem uma expectativa de bem, ou de quem espera o bem” (HOBBES, 1983).
PortaO pensamento de Hobbes se coloca em evidência na história da filosofia como uma teoria de caráter profundamente racionalista. Devedor das idéias de seu tempo, ele constrói uma teoria que traz consigo aspectos marcantes de sua época tais como o racionalismo, um forte apego à geometria, ao método dedutivo, à física de Galileu etc. Em sua obra, podemos notar também a presença dos ideais filosóficos políticos que surgem no bojo do período moderno, tais como o pensamento elaborado pelo francês Jean Bodin, o inglês Tomas Morus, Hugo Grócio, Maquiavel, entre outros, que já no século XVI, surgiam com grande apelo.
Hobbes edifica, desta forma, uma teoria do Estado que possuirá suas bases fundadas em alguns dos aspectos salientados por esses autores. Deste modo, buscará elaborar um modelo mecanicista e materialista que possa dar conta de uma construção que abarque “todo o lugar no homem”.
Nesse trabalho, buscaremos, no entanto, enfatizar não o aspecto precisamente político-jurídico de suas obras, ao menos não diretamente, mas teremos sim, como eixo central, o objetivo de investigar outro aspecto da construção do homem, a saber, as paixões. Por conseqüência, indiretamente, abordaremos em alguns momentos questões de relevância para o modelo de Estado proposto por Hobbes, isto é, enfatizaremos a presença das paixões no homem, e a partir daí, suas implicações na formação do Estado civil.
O modelo de homem tal como entendido por Hobbes, assemelha-se á uma máquina, cujo funcionamento resulta de um encadeamento gerado a partir da incidência de movimentos externos (agente) que provocam movimentos internos (paciente). Nesse sentido, é que podemos entender a caracterização exposta acima de que o mecanicismo ocupa um lugar central no estudo da composição humana (antropologicamente falando).
Entretanto, antes de nos determos nesse processo de formação das paixões se faz necessário alguns esclarecimentos.
É através da sensibilidade que o homem obtém conhecimento acerca de tudo o que lhe cerca. A sensação é trabalhada como uma “ilusão originária, causada pela pressão, isto é, pelo movimento das coisas exteriores nos nossos olhos, ouvidos e outros órgãos a isso determinados” (HOBBES, 1983).
Através da sensação é que conseguimos entender o que chamamos movimentos internos e movimentos externos. Porém, para esclarecer esses dois termos citados (movimentos internos/ movimentos externos) é necessário antes nos remetermos ao que vem a ser movimento.
Para tentar elucidar a questão buscaremos auxílio nos escritos de Hobbes que caracterizam sua Filosofia primeira, ou seja, aquela que explica a realidade última da natureza humana.
De início, Hobbes mostra como que mesmo enfrentando um problema semelhante ao discutido por Descartes, ou seja, o problema da origem do conhecimento ou da forma com que podemos apreender algo, sua resolução não caminhará nos mesmos trilhos da resposta proposta pelo autor das Meditações Metafísicas. Hobbes mostrará que o conhecimento da proposição cartesiana “eu existo” depende realmente da proposição “eu penso” contudo questiona ainda, de onde viria essa última. E sua resposta não recorre ao dualismo ontológico entre substância extensa corpórea e substância espiritual pensante como faz Descartes quando diz:
de um lado, tenho uma idéia clara e distinta de mim mesmo, na medida em que sou apenas uma coisa pensante e inextensa, e que, de outro, tenho uma idéia distinta do corpo, na medida em que é apenas uma coisa extensa e que não pensa, é certo que este eu, isto é, minha alma, pela qual eu sou o que sou, é inteira e verdadeiramente distinta de meu corpo e que ela pode ser ou existir sem ele. (DESCARTES, 1973)
De acordo com o que Descartes afirma, podemos trabalhar em dois planos distintos. O primeiro, da substância corpórea e o segundo, da substância pensante, a primeira extensa e a segunda espiritual.
Hobbes, por sua vez, aborda a mesma problemática, porém não fazendo a mesma distinção de Descartes, ou seja, não recorre ao dualismo ontológico cartesiano, e nos mostra que não podemos conceber qualquer pensamento sem uma coisa que pense, uma vez que a origem de todo pensamento está diretamente ligada a “aquilo que denominamos sensação (pois não há nenhuma concepção no espírito do homem, que primeiro não tenha sido originada, total ou parcialmente, nos órgãos dos sentidos” (HOBBES ,1983).
Desta forma, podemos observar como Hobbes enfatiza a idéia de que o sujeito de um pensamento será sempre um sujeito corporal. Assim, tanto os sujeitos como os objetos, serão corpos, e desta forma, Hobbes “corajosamente reduz toda a realidade a um conjunto de corpos em movimento” (MARGUTTI, 1988).
Portanto, podemos assentar duas questões básicas no que tange a essa primeira argumentação, quais sejam:
Primeiro: Hobbes desenvolverá sua análise do homem baseando-se em princípios mecânicos.
Segundo: ele não recorrerá a uma noção materialista dualista entre corpo e espírito, isto é, em linguagem cartesiana, ele não fará a distinção entre res-cogita e res-extensa.
Bem, ao partirmos dessas duas constatações básicas, podemos dizer que o homem hobbesiano é sim resultado de um princípio de causalidade mecânica, de modo que, é através de movimentos recebidos através da sensibilidade que teremos as paixões. E é através desse princípio de causalidade mecânico-empírica, que derivarão todas as “paixões humanas” como a alegria, tristeza, ódio, vingança, medo, esperança, etc.
Portanto, de início temos que “as paixões humanas” são resultantes da ação de corpos externos (agente) que causam movimentos internos em outros corpos (paciente). O agente “é o corpo que, ao empurrar um outro, gera movimento neste último” e paciente “é o corpo que, ao ser empurrado por um outro recebe movimento deste último” (MARGUTTI, 1988). No entanto, o processo que viabiliza as paixões não é assim tão simples, isto é, não é causado apenas por uma relação de ação e reação. Esse movimento de ação e reação de corpos externos em corpos internos, não dá conta do que realmente ocorre no âmbito das paixões humanas do ponto de vista de sua formação. Acerca dessa relação, poderíamos dizer que ela é apenas um efeito do que se processa no homem, isto é, um segundo momento que propicia a ocorrência das paixões. Antes dessa interação agente/paciente, há uma força que atua no interior do homem e que é a grande responsável pela forma com que as paixões se formam.
Essa força será um movimento primeiro que se processará no interior da mente, que por uma série de transmissões, culminará na realização do movimento corporal. Aqui estamos bem no centro da teoria hobbesiana das paixões.
Esse movimento se processa no interior do homem e precede a relação de afecção entre os movimentos externos/internos, e ainda por sua vez, é a origem interna dos movimentos externos. Ele se manifesta como um movimento original primeiro, interno e microscópico que se inicia no interior do corpo antes de se manifestar de forma definitiva em ações externas. E é o que Hobbes denomina esforço.
Mesmo que os homens não tenham conhecimento desses pequenos movimentos, eles existem, e estão nos “inícios do movimento, no interior do corpo do homem, antes de se manifestarem no andar, na fala, na luta e outras ações visíveis” (HOBBES, 1983). Esse movimento é comumente chamado “conatus” e aparece no original inglês do De Corpore como endeavour.
Busquemos esclarecer o que de fato foi dito até aqui.
O complexo modelo científico materialista-empirista de Hobbes nos leva a algumas conclusões que coloca o autor dentro de uma tradição que nos remonta a Galileu e a Bacon. Ao primeiro, é devedor da concepção de física do movimento que conduz seu pensamento, e do segundo, Hobbes recebe toda teoria do racionalismo radical que atravessará os séculos e que perdurará em suas bases mais fundamentais até os dias de hoje.
Dentro dessa concepção que situa Hobbes como herdeiro de Bacon e Galileu existe algo que tem como base um dado empírico, e que é de primordial relevância para explicarmos o complexo aparato passional humano, esse algo é o que já mencionamos como “conatus”.
Sabemos que as paixões humanas são caracterizadas de acordo com aquilo que lhe é externo, ou seja, determinada atitude será vista como uma má atitude na medida do tipo de conseqüência que ela trará ao sujeito que a praticou. Assim, se entre dois homens existir uma desconfiança recíproca, e um deles, num golpe, tirar a vida do outro, essa atitude será benéfica para aquele que desferiu o golpe, podendo reclamá-la como boa. Isso mostra o quão relativista é a teoria das paixões, e está na trilha do que Hobbes diz no capitulo VI do Leviatã, ou seja, que não há lei do certo ou do errado enquanto não houver Estado.[3][1]
Desse modo, podemos observar que o bem e o mal só podem ser medidos de acordo com a conseqüência que cada ação provoca num determinado indivíduo, sendo que o que pode significar o bem de um pode também ser o mal de outro, e ainda, o que é bom hoje pode não o ser amanhã. A partir dessas definições devemos caracterizar todas as paixões humanas tais como justiça, felicidade, amor, etc. Assim também o conatus (endeavour) é gerado nos homens a partir da sensação produzida por um objeto. Quando um determinado objeto consegue afetar os homens, ou melhor, provocar neles um esforço no sentido de tentar alcançá-lo, Hobbes chama esse impulso de “desejo”. Quando esse esforço se dá no sentido de afastar o objeto recebe o nome de “aversão”. Em suma, desejo e aversão significam movimentos, um de aproximação outro de afastamento, sempre em relação aos objetos que afetam os homens. A imobilidade diante desses objetos, ou seja, a indiferença, é o que ele chama de “desprezo” (HOBBES, 1983).
A teoria das paixões elaborada por Hobbes é concebida sempre em pares, isto é, o mesmo movimento que causa o amor causa também o ódio, e a diferença existente entre amor e ódio reside, única e exclusivamente, na conseqüência que essas geram em cada indivíduo. Quando o movimento primário (conatus) causa um efeito positivo, a paixão gerada é o amor, se o efeito causado for negativo, teremos então o ódio.
O conatus, núcleo central que se caracteriza como movimento primeiro, deve ser pensado sempre no vetor sujeito-objeto, como aquilo que se manifesta em direção ao que lhe provoca.
Este esforço quando vai em direção a algo que o causa, chama-se apetite ou desejo, sendo o segundo o nome mais geral , e o primeiro freqüentemente limitado a significar o desejo de alimento...Quando o esforço vai no sentido de evitar alguma coisa  chama-se geralmente aversão (HOBBES, 1983).
Deste modo podemos dizer que o grande fundamento, o motor de todo aparato passional reside no fato elementar do “conatus”, ou seja, no desejo primeiro de se atingir algo. Ele é a pedra que ampara o edifício da constituição e da composição humana do ponto de vista de suas paixões. É o movimento que traz para si aquilo que é útil para a conservação do homem, e também à força que repudia, que afasta tudo que possa servir de ameaça a essa conservação.
Aqui poderíamos objetar se o “conatus” seria duas forças: uma que busca os objetos que visam à conservação (apetites), e outra que afasta os objetos que a ameaçam (aversão) aproximando assim, mais uma vez, a filosofia de Hobbes à de Descartes.
A resposta a ser dada, para sermos coerentes com o modelo hobbesiano, parece caminhar no sentido de que essa é uma única força:
Dos apetites e aversões, alguns nascem com o homem, como o apetite pela comida, o apetite de excreção e exoneração (que podem também, e mais propriamente, ser chamados aversões, em relação a algo que se sente dentro do corpo) (HOBBES, 1983).
Dentro da filosofia hobbesiana não há espaço para qualquer tipo de dualismo original como podemos ser levados a pensar. O que de fato há é uma tendência que nos induz a tomar certas atitudes e a repudiar outras, resguardando sempre o mesmo desejo que se manifesta, ora em forma de aproximação, ora em forma de distanciamento, de acordo com a realidade do sujeito, e sempre com a finalidade de saciar o desejo de auto preservação.
O fato de Hobbes trabalhar as paixões sempre em pares contrastantes (amor/ódio, desejo/aversão, medo/esperança) não significa que a origem dessas paixões também seja antagônica, ou seja, que exista um dualismo ontológico. O que ocorre em sua filosofia é uma diferenciação modal, isto é, a dualidade não é original, mas sim uma distinção lógica que possui uma só origem, um só núcleo, que é o esforço (conatus).
No pensamento de Hobbes, as paixões desempenham um papel dúbio, isto é, se por um lado a desconfiança natural, o egoísmo e a competição por poder e mais poder levam o homem a um estado de tensão eminente, por outro lado, o medo de ter sua vida perpetuada nesse estado instável, e a esperança de que se pode sair dele, leva o homem a buscar meios para construir o corpo político.
Hobbes não concebe, como os aristotélicos, que os homens possam ser vistos como zoón politikon, ou seja, que eles vivam naturalmente em sociedade. Segundo ele, ao contrário do que havia se postulado até então, a convivência entre os homens é potencialmente conflituosa, dado que, vivem sob o imperativo de paixões como a desconfiança e o egoísmo, e essas condições necessariamente levam a um estado de tensão eminente. Contudo, para eliminar esse estado, o homem, após uma série de ponderações acerca de sua realidade, trabalha no sentido de construir um aparato jurídico que possa regular a vida comum, e assim não mais viver sob a tutela da pura força. Nesse momento se fará presente a esperança, como uma paixão ativa que atuará de mãos dadas com o medo, anulando-o e possibilitando a crença de que, no Estado civil regido por leis (lex) positivas, o homem não viverá em guerra e a paz poderá ser alcançada.
É derivado da necessidade dos indivíduos celebrarem o pacto, que a esperança se fará presente, auxiliando o homem a sair dessa situação instável, isto é, do estado de guerra. É a essa paixão que nos deteremos nesse trabalho.
Após termos exposto em linhas gerais a formação das paixões, vejamos como uma delas, a saber, a esperança se articula com a formação do Estado Civil.
Quando publica em 1640 a obra A Natureza Humana Hobbes formula um conceito de esperança que contém ao mesmo tempo o que ela é, e o que caminha a seu lado quando a expectativa de futuro propícia dessa paixão é negativa. Assim diz Hobbes:
“A ESPERANÇA é a expectativa de bem futuro, como o medo é expectativa de mal. Mas quando, agindo alternadamente em nossas mentes, há algumas causas que nos fazem ter a expectativa de bem e, se as causas que nos fazem ter a expectativa de bem forem maiores do que as que nos fazem ter a expectativa de mal, a paixão é toda esperança; se ocorre o contrário é medo. A privação absoluta de esperança é DESESPERO, e um grau menor dessa privação é DESALENTO. (HOBBES, 1983)
As características formadoras da filosofia de Hobbes, como foi posto acima, resultam de movimentos voluntários internos que ocorrem no indivíduo. Esses movimentos são classificados em dois tipos: movimento vital e movimento voluntário ou animal.
Movimentos vitais são aqueles que compõem a própria condição de “ser vivo” do homem, circulação do sangue, o pulso, a respiração, a digestão, a nutrição, a excreção etc. Já os movimentos voluntários são aqueles resultantes das sensações externas causadas no interior do indivíduo através do que vemos, ouvimos etc, de onde derivam o nosso “falar, andar ou mover qualquer dos membros da maneira como anteriormente foi imaginada pela mente” (HOBBES, 1983).
Para entender o conceito de esperança, no âmbito em que nos propomos, não será necessário abordar os movimentos vitais, ficaremos então apenas nos movimentos voluntários, que são os causadores dos esforços (endeavour) que são o núcleo de formação das paixões. O esforço pode ser tomado como um “movimento pontual num dado instante” (MARGUTTI, 1998) que quando direcionado a algo que o causa recebe o nome de apetite ou desejo. Porém quando direcionado a evitar algo que possa significar sinal de alguma ocorrência negativa derivada desse movimento, Hobbes o nomeia aversão. Todas as vezes que a palavra “desejo” for mencionada ela estará imbuída de uma significação que buscará salientar a ausência do objeto, o que caracteriza o desejo é sua relação com a busca de algo que ainda não se possui. A aversão, no entanto, se caracteriza por mais um componente, isto é, não só podemos ter um sentimento negativo (ódio) com relação a algo que eu tenha conhecimento, como também referente a algo que não se sabe se pode ou não nos causar dano. Nesse momento mais uma vez nos deteremos apenas aos desejos e apetites, pois deles derivarão a esperança.
O objeto do apetite ou dos desejos dos homens é o que pode ser chamado de “bom”, pois quem julga sobre o que é bom ou ruim quando não há Estado, é o próprio homem. A viabilização do Estado civil através do pacto é o que irá possibilitar um poder (soberano) para decidir sobre o que é justo ou injusto, na medida em que isso será benéfico para a preservação da paz dentro do Estado soberano.
Hobbes não acredita em um “valor intrínseco” de conceitos como a justiça, injustiça, bom, mal, mas sim que isso será arbitrado pelo soberano, quando houver Estado, ou por cada pessoa quando não houver. Desta forma “não há nada que o seja simples e absolutamente, nem há qualquer regra comum do bem ou do mal, que possa ser extraída da natureza dos próprios objetos” (HOBBES, 1983).
O homem, concebido em sua integralidade natural, se vê entregue às mais terríveis possibilidades de guerra, e essa impressão é corroborada graças à memória, pois essa pode remeter a lembranças de possíveis situações de conflitos vividos, e essas lembranças causam, por sua vez, movimentos internos no indivíduo. Esses movimentos, quando aliados a uma crença de que se consiga o que se está almejando, é nomeado “esperança”.
É importante salientar que, no pensamento de Hobbes, a cadeia dedutiva de relações de causa e efeito não estão isentas de uma participação efetiva das paixões, ou seja, elas estarão presentes em todos os atos de deliberação do homem.
Ao serem inclinados pela recta ratio, na direção de realizar o pacto, os indivíduos não o fazem apenas com o intuito de alcançar a paz que não há no estado de natureza. O pacto só pode ser possível, graças a crença que possuem no ato de sua celebração. Essa crença é que anuncia que, a esperança da paz tão desejada poderá vigorar no Estado civil, e através desse Estado, os homens não mais viverão sob a égide do medo que é característico do estado de guerra.
Nesse momento, podemos observar o quanto ás paixões são importantes para Hobbes, pois, não está presente apenas a esperança resultante do desejo de paz que o homem nutre ao ser guiado pela razão[4][2], mas também está presente o medo que caminha lado a lado com a esperança, como já foi dito. Ambos são derivados do desejo de se conquistar algo, quando esse desejo é seguido da expectativa de bem, o chamamos esperança, quando é seguido de uma expectativa de algo negativo, o chamamos medo.
No Leviatã, Hobbes atribui à esperança além da conotação já prescrita no A Natureza Humana uma outra, a saber, ele a compara à confiança, ao dizer que “A esperança constante chama-se confiança em si mesmo” (HOBBES, 1987).
Tal comparação pode ser compreendida na medida em que nos voltarmos, mais uma vez, à obra de 1640, lá Hobbes define confiança como “a paixão que procede da crença de quem tem uma expectativa de bem, ou de quem espera o bem” (HOBBES, 1983).
Ora, a semelhança das definições de esperança dada no Leviatã e de confiança dada no A Natureza Humana é visível, pois ambas são movidas pela expectativa de bem. Porém, a confiança é de certa forma derivada da esperança na medida em que “procede da crença” de um sujeito que tenha a expectativa constante de bem, ou seja, que tenha esperança.
A palavra constante é importante nesse contexto dado que o movimento externo, ou seja, tudo o que afeta o homem e que está fora dele e é recebido por ele através da sensibilidade, pode ser mudado. Quando se processa tal mudança, mudará também o movimento provocado nos órgãos dos sentidos, que por sua vez, significará a ocorrência de mudanças nas paixões. Essa diversificação acarreta uma transformação no diagnóstico dado pela sensibilidade, e ainda interfere na continuidade das paixões, na medida que elas são efeitos sofridos pelos movimentos internos causados por movimentos externos.
Deste modo, podemos dizer que, é pelo fato da expectativa de bem nomeada “esperança” ser uma expectativa constante que ela pode também ser chamada de confiança. Portanto, a esperança só pode ser tomada confiança na medida de sua constância.
Pelo que foi dito nesse texto, pretendemos ter deixado claro, a relevância que deve ser atribuída ao aparato passional Hobbesiano. Mesmo sabendo de seu forte apego ao racionalismo, sabemos que o que caracteriza o pensamento hobbesiano, não necessariamente caracteriza, como um todo, o homem hobbesiano.
A razão que ampara o pensamento de Hobbes nos leva a concluir que, seu processo investigativo, isto é, seu método, conduz a um diagnóstico da natureza humana que a situa dentro de um sistema altamente influenciado pelas paixões. Nessa perspectiva é que a esperança será um fator de grande importância na construção do Estado civil, pois em parte, é calcado na crença alimentada por ela que os homens se propõe a edificar o constructo racional que é o Estado soberano.
A esperança é parte componente desse processo de passagem Estado de natureza/Estado civil, pois na medida em que é trabalhada pela razão, ela causa no homem o desejo, isto é, “a expectativa de bem futuro”, de instituir o pacto fundante que é o mensageiro da paz entre os homens.
O Estado Civil surgirá também por estar amparado na confiança, que é “a paixão que procede da crença de quem tem uma expectativa de bem, ou de quem espera o bem” (HOBBES, 1983).
Portanto, a expectativa de futuro proporcionada pela esperança e a expectativa de bem proporcionada pela confiança, serão dois pilares que sustentarão a edificação do Estado soberano. A expectativa de futuro, por si só, não garante que o projeto de construção do Estado seja bem sucedido, é preciso que ela seja direcionada por uma expectativa de bem, isto é, a esperança não conduzirá sozinha o processo de instauração do corpo político. Se não for amparada por uma expectativa de bem, ou seja, por uma confiança, a esperança será como uma expectativa indeterminada, e assim, ela não poderá garantir que um sujeito esteja agindo na direção de possibilitar a saída do estado de guerra.
Para essa paixão se tornar determinada, ou seja, para que ela atue em função do Estado, é necessário que ela tenha um objeto, e esse objeto será a expectativa de bem contida na definição de confiança.
Assim, a articulação entre as definições de esperança e confiança, será fundamental para definir o papel desempenhado pela esperança na filosofia política de Hobbes. Do contrário, ou seja, se for auxiliada por uma expectativa negativa, a paixão não será esperança e sim medo.
Essas duas paixões quase que sintetizam o processo de construção do Estado civil. Se por um lado o medo nega o estado de guerra, por outro, a esperança posta no trabalho o induz a buscar o Estado. Complementam-se nesse instante a negação da guerra e a afirmação da paz.
Procuramos mostrar nesse trabalho, que Hobbes faz em sua obra uma discussão acerca do engate entre afetividade (paixões) e a política. Nesse sentido, ele nos mostra ainda que, temer a guerra apenas, não será profícuo se não tivermos a esperança de que, se atuarmos em prol do contrato, conseguiremos construir o Estado e alcançar o grande objetivo, que é a paz.
nto, a expectativa de futuro proporcionada pela esperança e a expectativa de bem proporcionada pela confiança, serão dois pilares que sustentarão a edificação do Estado soberano. A expectativa de futuro, por si só, não garante que o projeto de construção do Estado seja bem sucedido, é preciso que ela seja direcionada por uma expectativa de bem, isto é, a esperança não conduzirá sozinha o processo de instauração do corpo político. Se não for amparada por uma expectativa de bem, ou seja, por uma confiança, a esperança será como uma expectativa indeterminada, e assim, ela não poderá garantir que um sujeito esteja agindo na direção de possibilitar a saída do estado de guerra.
Para essa paixão se tornar determinada, ou seja, para que ela atue em função do Estado, é necessário que ela tenha um objeto, e esse objeto será a expectativa de bem contida na definição de confiança.
Assim, a articulação entre as definições de esperança e confiança, será fundamental para definir o papel desempenhado pela esperança na filosofia política de Hobbes. Do contrário, ou seja, se for auxiliada por uma expectativa negativa, a paixão não será esperança e sim medo.
Essas duas paixões quase que sintetizam o processo de construção do Estado civil. Se por um lado o medo nega o estado de guerra, por outro, a esperança posta no trabalho o induz a buscar o Estado. Complementam-se nesse instante a negação da guerra e a afirmação da paz.
Procuramos mostrar nesse trabalho, que Hobbes faz em sua obra uma discussão acerca do engate entre afetividade (paixões) e a política. Nesse sentido, ele nos mostra ainda que, temer a guerra apenas, não será profícuo se não tivermos a esperança de que, se atuarmos em prol do contrato, conseguiremos construir o Estado e alcançar o grande objetivo, que é a paz.


Jorge Berkeley

Uma etapa ulterior do fenomenismo empirista é representada por Berkeley. Ele suprime, criticamente, as qualidades primárias, as sensações objetivas de Locke, evidenciando que são semelhantes às secundárias e, logo, também elas subjetivas. E suprime também, definitivamente, o conceito lockiano de substância material, que deveria ter sido a causa misteriosa de nossas sensações, objetivas, visto que, no empirismo, a substância não passa de um nome. Isto não impede que Berkeley - por motivos práticos, morais e religiosos - incoerentemente, conserve ainda no seu empirismo os conceitos de substância, causa e espírito, isto é, os conceitos de substância e causa espiritual. Este resíduo realista e transcendente será definitivamente eliminado pela crítica radical e coerente de Hume, o último e o maior dos empiristas prá-kantianos.
Vida e Obras
  nasceu em 1685 perto de Dysert Castle, na Irlanda, de uma família de origem inglesa. Estudou no Trinity College em Dublin, formando-se mestre em artes em 1707. Ordenado pela Igreja anglicana, a princípio ensina grego (sua obra, um dia, assumirá um tom platônico), em seguida hebreu e teologia no Trinity College. Entre 1702 e 1710, podemos seguir, em seu caderno de anotações (Commonplace book), a formação de seu pensamento. Desde 1709 ele escreve sua Nova teoria da Visão. Seu Tratado sobre os Princípios do Conhecimento Humanoé publicado em 1710. As intenções apologéticas de sua obra aparecem claramente nos artigos polêmicos, que escreveu em 1713, no jornal The Guardian, contra as idéias de um célebre livre-pensador, Arthur Collins. Em 1713, igualmente, aparece os Diálogos entre Hylas e Philonous. Berkeley então viaja pela França e pela Itália; em seguida se decide a propagar o pensamento cristão nas possessões americanas da Inglaterra, partindo para as Bermudas, onde sonha fundar um colégio, idéia à qual deve renunciar, posto que o governo inglês não lhe envia os fundos prometidos. Nessa época, ele lê Plotino sobretudo. Ao retornar, é nomeado bispo anglicano de Cloyne. Publica uma nova obra contra os livres-pensadores, "Alciphrom ou o filosofúsculo" (Alciphrom or the minute philosopher). Em 1740, sobrevém uma epidemia na Irlanda, que o improvisa como médico; cuida de suas ovelhas com água de alcatrão (receita que conheceu na América), na qual vê um remédio universal, o que o leva a uma cadeia (seiris, em grego) de reflexões muito platônicas sobre a natureza, a Providência e Deus, que ele nos oferece em sua última obra, "Síris ou Reflexões e pesquisas filosóficas concernentes às virtudes da água de alcatrão e diversos outros temas conexos entre si e originados um do outro"(1744). Na Teoria da Visão, Berkeley parte do seguinte problema (colocado pelo físico Molyneux): Como podemos ver a distância de um objeto? O raio luminoso, orientado perpendicularmente ao olho, só projeta um ponto que invariavelmente é o mesmo, quer a distância seja longa ou curta. Por conseguinte, falando estritamente, não vemos a distância. Um cego de nascença, afirma Berkeley, ao qual fosse dado ver repentinamente, teria a impressão de que todos os objetos tocavam seus olhos (vinte anos após o obra de Berkeley, o cirurgião Cheselden publicará, nas Philosophical Transactions of the Royal Society, a observação de um menino de quatorze anos, operado de catarata, que parece confirmar o ponto de vista de Berkeley. Voltaire, em sua Filosofia de Newton, 1741, torna conhecida essa experiência que Condillac e Diderot discutirão em sua Carta sobre os cegos para uso dos que vêem).
Jorge Berkeley

Para Berkeley, a distância, portanto, não é percebida, mas julgada a partir de signos tais como a grandeza aparente ou da luminosidade mais ou menos viva dos objetos. Esse homem pequenino e pouco visível está longe de mim, porque a experiência mostra que quando um homem tem essa grandeza aparente, deve andar por alguns momentos a fim de o tocar. Por conseguinte, a experiência me ensina a interpretar aparências visuais como o sinal da distância maior ou menor dos objetos.

Dessa análise psicológica, Berkeley tira conclusões importantes:
Não existe espaço objetivo, espaço "em-si", para Berkeley. O espaço não é o "sensível-comum", simultaneamente percebido pela visão e pelo tato, como dizia a filosofia escolástica, nem a extensão geométrica, tão cara aos cartesianos. Existem dois espaços distintos: umvisual, relativo ao sentido da visão, e o que possui apenas duas dimensões, e um espaço tátil(a exploração tátil me revela, na origem, as distâncias dos objetos), o que me ensina a decifrar as correspondências entre esses dois tipos de sensações (visuais e táteis).
a)
As correspondências existentes entre os dados visuais e a distância dos objetos não podem ser previstas a priori. É a experiência, e só ela, que me faz conhecer a ligação entre uma mudança de claridade e uma mudança de distância, exatamente como a experiência, isto é, a aprendizagem da língua natal me faz conhecer a ligação convencional entre os objetos e as palavras que os designam. Compreendemos bem que, para Berkeley, o cubo que vejo e aquele em que toco não são um só e mesmo objeto! Não mais existem relações entre um e outro, exceto a que existe entre o cubo em que toco e a palavra de quatro letras com que o designo. É por preconceito que acredito na existência de "objetos". Tudo o que a experiência me fornece é uma multidão de sensações diversas entre as quais existem correspondências. Os dados visuais são o signo dos dados táteis. Ora, toda linguagem é a instituição de um espírito, por conseguinte, uma linguagem universal da natureza (como aquela que faz dos dados visuais o signo das experiências táteis) só pode ser obra de um Espírito universal. As correspondências entre o atlas tátil e o atlas visual simplesmente manifestam a Providência de Deus.
b)

Nominalismo de Berkeley
Ele declara não compreender o que seja uma idéia abstrata. Por isso ele se aproxima de Locke e do ponto de vista de todos os outros empiristas ingleses. Por exemplo: que é a idéia abstrata de Homem? Um nome, uma simples palavra (uma imagem concreta, lida ou ouvida), pois, quando represento mentalmente um homem, é preciso que essa imagem seja a de um homem particular, grande ou pequeno, disforme ou bem proporcionado, etc.
a)
Todavia, se Berkeley nega a idéia abstrata, ele admite a idéia geral. Por exemplo, essa palavra "homem" que pronuncio não passa, em suma, de uma imagem sonora concreta. Mas essa imagem sonora, eu a faço corresponder a um sem-número de imagens visuais (as de todos os homens que posso ver). A imagem concreta se torna geral quando se transforma em signo, em substituto de outras imagens concretas. Uma imagem concreta, uma idéia concreta (para Berkeley, idéia e imagem são a mesma coisa; a palavra idéia significa representação mental) é o símbolo de outras idéias concretas. No universo de Berkeley, os "signos" desempenham um grande papel. Pensar não é, para ele, aprender uma essência abstrata, mas passar de uma imagem a outra graças à função simbólica.
b)

O Imaterialismo
"Esse est percipi". É certo que o ser não se reduz ao que é passivamente percebido e que eu, que ativamente percebo, também existo. Para Berkeley, portanto, ser é ser percebido ou perceber: "Esse est percipi vel percipere". Não há no mundo senão idéias e espíritos. É o que, nos célebres diálogos, o imaterialista Philonous (esse nome, em grego, significa amigo do espírito), porta-voz de Berkeley, demonstra a Hylas (cujo nome, em grego, significa matéria).
É a outra doutrina fundamental de Berkeley que facilmente vemos estar ligada ao seu nominalismo. Para ele, toda abstração é ilegítima. E, por exemplo, não tenho o direito de dizer, como Descartes, que a extensão existe objetivamente, ao passo que a cor é subjetiva, pois todos os objetos me são dados simultaneamente como extensos e coloridos. De um modo mais geral, nada me autoriza a imaginar, por abstração, a existência de pretensos objetos materiais fora de meus estados de consciência. "Não posso representar em meus pensamentos uma coisa sensível ou um objeto isolados da sensação que deles tenho; o objeto e a sensação são idênticos e não podem ser abstraídos um do outro." Eis uma porta alta e sólida, pintada de verde e contra a qual me choco dolorosamente. Não é verdadeiramente uma coisa material que existe como tal, fora de minhas sensações! Absolutamente, responde Berkeley. Esta porta nada mais é do que uma soma de representações mentais, um conjunto de "idéias". Sua forma e a extensão que ela ocupa são sensações; sua cor verde uma sensação visual, o contato de minha mão com ela uma sensação tátil e a própria dor que sinto após o choque é um estado de consciência. Não possuo mais o direito de dizer que tenho uma ou várias idéias da porta, posto que ela não passa de um conjunto de idéias. Não tenho a menor razão de abstrair da realidade sensível que é a dos meus estados de consciência, pretensas coisas materiais que, misteriosamente, existiriam além de minhas percepções. A única realidade das coisas é serem percebidas,

Realismo ou Idealismo?
"ser percebido"e nada mais.Dado esse detalhe, Berkeley reclama o bom-senso popular e se ri de Descartes que duvidava de seus sentidos. Berkeley recusa todo ceticismo e aceita o dado tal qual é: "O cavalo está na cocheira e os livros estão na biblioteca como antes"; o chamado idealismo de Berkeley não passa de um realismo ingênuo. A aparência é que é a verdadeira realidade. O mundo visual tem realmente as cores que aparenta ter, o mundo da audição é verdadeiramente sonoro, etc. Como Philonous declara a Hylas: "Você se engana, não quero transformar as coisas em idéias, quero antes transformar as idéias em coisas, pois os objetos imediatos da percepção que, segundo você, são apenas as aparências das coisas, eu os considero coisas reais".
O que Berkeley rejeita é a realidade de uma substância material que seria o suporte misterioso, invisível, impalpável, das qualidades sensíveis. O que ele não admite é a coisa que estaria oculta sob nossas representações, é um além material que transcenderia o percebido. Sua filosofia, segundo a qual a realidade se reduz ao que nos é dado concretamente, quer nos libertar daquilo que Nietzche, mais tarde, chamará de "a ilusão dos além-mundos". Como diz Bergson muito bem: "O que o idealismo de Berkeley significa é que a matéria é coextensiva à nossa representação, que ela não tem interior, não tem suporte, que ela nada oculta, nada envolve, que se estende superficialmente e que se coloca inteira a todo instante no que ela dá". Berkeley não nega, portanto, a existência das coisas sob a condição de que se aceite que existir é
o que existe é o que vemos e tocamos. O que não vemos e não tocamos não existe. Por conseguinte, Berkeley rejeita todas as "abstrações" dos matemáticos e dos físicos. Não aceita a "extensão inteligível" de Malebranche e só admite um espaço sensível. As novas matemáticas do infinitesimal, portanto, serão falsas a seus olhos. O espaço dado aos sentidos não pode ser divisível ao infinito, uma vez divisível ao infinito seria admitir que um fragmento de extensão existe sem ser percebido. Do mesmo modo, Berkeley - antes de Bergson - rejeita como ficção o tempo abstrato, homogêneo e mensurável dos físicos. O único tempo real é o tempo concretamente percebido; "mais longo na dor do que no prazer".
A filosofia de Berkeley, portanto, é a filosofia do realismo concreto levada às suas últimas conseqüências:

Imaterialismo e Teologia
Tal como expusemos, o imaterialismo de Berkeley suscita uma dificuldade. Se não há nenhuma transcendência das coisas, se o objeto nada mais é do que a representação que dele tenho, como é possível que vários espectadores vejam juntos, no mesmo lugar, a mesma coisa? Por exemplo, as pessoas que neste momento se encontram em meu escritório podem dizer que aí existe uma poltrona de couro. Se - como pensava Hylas - a poltrona de couro existe materialmente e nossas sensações a refletem, não há dificuldade. Mas, se como pensa Philonous-Berkeley, nossas sensações não remetem a um objeto exterior, como é que todas as pessoas presentes podem pretender ver a mesma coisa?
a)
Berkeley responde a isso, fazendo com que Deus intervenha. Deus já estava encarregado de explicar as admiráveis correspondências entre dados táteis e visuais, era ele o autor dessa linguagem universal e benfazeja da natureza. E agora Berkeley nos diz que Deus é quem nos envia, numa ordem harmoniosa, nossas "idéias", isto é , nossas percepções. A ordem de minhas "idéias", sua admirável concordância com as "idéias", isto é, com as percepções dos outros espíritos, estão erigidas como prova do poder e da bondade do Criador.
b)
Por que dizer, com efeito, que Deus criou a matéria e que o homem a conhece por meio de "idéias"? Não se pode fazer economia dessa entidade misteriosa? Basta pensar que o espetáculo do universo, longe de ressaltar de maneira ininteligível uma matéria opaca, é diretamente imprimido pelo Criador na consciência das criaturas. O mundo é uma mensagem de Deus. É um "discurso que Deus faz aos Homens"; ele me fala diretamente quando decifro o mundo sensível. Quando as metafísicas materialistas falam de substância, de força, de extensão abstrata, colocam uma tela de pesadas ficções entre Deus e essa palavra cotidiana de Deus que é o mundo. Bergson apreende efetivamente o que há de essencial na doutrina de Berkeley quando a comenta nos seguintes termos: "A matéria seria uma língua em que Deus nos fala. As metafísicas da matéria, tornando espessa cada sílaba, dando-lhe um destino, erigindo-a em entidade independente, afastariam nossa atenção do sentido do som e nos impediriam de acompanhar a palavra divina".
c)
"É a matéria que não existe. Só Deus e os espíritos existem".
Em todo caso, vemos, por tudo isso, o alcance apologético que Berkeley pretende dar a seu imaterialismo. Aos materialistas, aos ateus que proclamam: Deus não existe, a alma não existe, Berkeley responde:

O Problema da Evolução em Berkeley
Em Siris, Berkeley enriquece seu imaterialismo com uma dimensão nova. A Providência - de quem as virtudes terapêuticas da água de alcatrão lhe recordam a benevolência ativa - surge-lhe, desde então, à maneira dos neoplatônicos, que lera na América, como um fogo sutil que circula através do Universo, como um fluido vital que o penetra inteiramente.
a)
Por outro lado, inspirado pelos platônicos que pregam a libertação quanto aos sentidos e insistem no conhecimento das realidades espirituais, Berkeley aprofunda sua reflexão sobre o conhecimento dessas realidades. Da primeira à segunda edição de seus Princípios do Conhecimento, seguimos facilmente o aprofundamento de seu pensamento. Na primeira edição, Berkeley mostra que as idéias, isto é, as representações mentais, são essencialmente passivas. É Deus quem nos fornece nossas "idéias", mas não temos idéia do próprio Deus, posto que ele é atividade suprema. Como, então, podemos conhecê-lo? A segunda edição traz uma resposta a esse problema e Siris vem explicitar essa resposta: temos uma noção de Deus. Este último que, nas primeiras obras, era um Deus cartesiano, criador das idéias em nossas consciências, torna-se um Deus malebranchiano, não apenas causa das idéias, mas morada das Idéias. Entre ele e nossas representações sensíveis surgem (como nas filosofias neoplatônicas) intermediários, arquétipos em que Deus se fundamenta para produzir nossas representações.
b)

Berkeley então nos propõe uma espécie de síntese muito original entre as filosofias de Locke e de Malebranche, com uma evolução cada vez mais acentuada em sua velhice para o malebranchismo, como sublinhou Gueroult. "Curiosa síntese, diz muito bem F.-J. Thonnard, entre empirismo e espiritualismo, entre gosto pelo sensível e aversão pela matéria." Todavia, Berkeley nunca seguirá Malebranche até o fim. Se, no fundo, aceita a teoria das causas ocasionais na matéria (a idéia visível não é a causa, mas o signo da idéia tangível que Deus produz em mim), se finalmente recai no tema da visão de Deus, se chega mesmo a ir mais além de Malebranche ao negar a existência das coisas materiais (que Malebranche aceita de acordo com o testemunho da Bíblia), Berkeley não aceita que a vontade das criaturas seja uma simples causa ocasional. Ele atribui à pessoa humana uma verdadeira "eficácia", uma liberdade real, recaindo, assim, no espiritualismo tradicional.


David hume

David Hume (1711-1776) nasceu em Edimburgo, Escócia, no dia sete de maio. Seu pai era um fidalgo da aldeia de Chirnside, onde tinha um sítio chamado Ninewells. Lá Hume passou a infância. Aos três anos perdeu o pai. Aos doze anos foi para Edimburgo junto com o irmão para estudar. Desde cedo gostou dos clássicos e adquiriu uma sólida formação cultural. Manifesta gosto pela filosofia.  Mas seus familiares queriam que ele estudasse advocacia. Ele entra na faculdade de jurisprudência, mas a abandona em 1726. Foi ler Cícero, Virgílio e Horácio. Desde os quinze anos tinha idéias para seu livro, o Tratado da natureza humana, que iria dar origem mais tarde à  Investigação sobre o entendimento humano. O tratado é considerado por muitos a sua melhor obra, apesar de ele ser muito jovem quando a escreveu. Em 1729, instigado por um insight que tivera sobre a nova ciência da natureza humana, mergulhou ainda mais nos estudos.
Hume namorou Anne Galbrath, que queria sua paternidade para um filho. Ela era casada. Hume sofre então de saúde, também porque estudava muito. Só se recuperou depois de um tratamento. Querendo correr o mundo aceitou o emprego de mercador, mas foi só até a França. Lá viveu três anos, adquirindo cultura, isolado. Em 1739 publica o Tratado sobre a natureza humana, depois de uma revisão feita para não chocar a filosofia oficial. Mas mesmo assim suas críticas à  metafísica tradicional eram contudentes. O livro não teve repercussão. Decepcionado, vai para Ninewells, e se relaciona com Adam Smith. O terceiro volume do tratado só é publicado em 1740. Em 1741, Hume publica os Ensaios morais, politícos e literários.  A obra é bem recebida, mas a repercussão não satisfaz a ambição de Hume. Candidata-se ao cargo de professor de ética na universidade de Edimburgo mas não é aceito, acusado de ateísmo e heresia.
Em 1745, virou preceptor do marquês de Amandale. Em 1746 tornou-se secretário do general Saint-Clair, participa então de uma expedição à  França e uma missão diplomática em Viena e Turim. Em 1748 é publicado a Investigação sobre o entendimento humano. Em 1751 surge os Diálogos sobre a religião natural, que só é publicado postumamente. Entre 1754 e 1762 publica a enorme História da Inglaterra. Enfim ele adquire fama e notoriedade como escritor. É assediado pelas mulheres, apesar de não ter boa aparência. Mas também tem critícos, entre eles os religiosos. Faz então várias amizades, como a com D’alembert (1727-1783), para quem deixa uma herança, e com o filósofo Helvetius (1715-1771). Em 1766, Hume volta à Inglaterra, junto com Rousseau. Hume lhe oferece proteção. Mas Rousseau tinha mania de perseguição, e acusa Hume de liderar um complô contra a sua pessoa. Acaba-se então a amizade. Hume escreve uma autobiografia, publicada após sua morte.
David Hume é o filósofo bretão mais importante do século XVIII. Ele é um empirista, e tira de Locke o sentido das representações, dividindo-as em representações dos sentidos e de auto percepção. As representações são póstumas às sensações. As impressões são sensações. A percepção pura, o sentir, o primeiro contato com o mundo – como uma criança o tem antes de se envolver em reflexões e desenvolver a mente, tudo isso são impressões. Mais tarde, através da representação,o sujeito forma a idéia. A idéia é um reflexo da impressão, uma cópia pálida, até uma deturpação da percepção bruta. Um exemplo de impressão é uma noção simples como perceber a tristeza. Um exemplo de idéia seria um anjo. Através das impressões criamos imagens (vale dizer quimeras) que não existem no mundo material. Para se chegar na imagem de um anjo tenho que compô-la.
A essa teoria de Hume dá-se o nome de empirismo psicológico, cuja consequência é o empirismo lógico. Uma palavra só é significativa se tem um correspondente no mundo. No uso nominal, precisamos da base empírica. Um triângulo, por exemplo é um nome que designa toda espécie de triângulos. Hume critica os livros filosóficos, complicados e aborrecidos, com as suas fórmulas sem a base no real. Dessa natureza são as conclusões metafísicas. A noção de substância, por exemplo não provém dos sentidos. E referindo-se à esses livros fala Hume: “Atira-o então ao fogo”.
Todas as idéias válidas tem fundamento na impressão. A abstração não existe. A base do conhecimento são as impressões e relações entre  as idéias, como as associações. Todas as impressões são inatas. Por inatismo Hume considera tudo que é original, e não uma cópia. Assim, as idéias não são inatas e Hume refuta o inatismo clássico, como Locke. As verdades dos princípios matemáticos são irrefutáveis. As deduções lógicas existem por demonstração.
O infinitamente pequeno não tem sentido, pois depende do ponto de vista, e quando este muda, o antigo desaparece.
Os objetos da razão podem ser dividos em relações de idéias e questões de  fatos. Ao primeiro grupo pertence as verdades matemáticas. Um triângulo terá em seus ângulos internos sempre a soma de dois retos, ou terá sempre três ângulos porque as coisas são assim por definição. No conceito de triângulo já está envolta esta definição. Ou seja, a relação de idéias remete apenas à própria razão humana que definem as relações de Idéias de um certo modo, e neste mundo, mesmo que não seja possível haver triângulos no mundo, ele será o que o que o homem definiu, pois é assim por convenção.
As conclusões de Hume tem valor assertório (assim é) e não apodítico (assim tem que ser). Essas conclusões tem uma validade universal, nasce comparando-se idéias, mas essas não são efetivas, só os objetos pensados tem efetividade.
O empirismo cético de Hume procede da filosofia de Berkeley e Locke. Como eles, Hume também critica o conceito de substância. Mas enquanto Berkeley criticava apenas a substância material , Hume ataca também a espiritual. Ele avança sobre a teoria de Berkeley. Refuta o conceito de alma de Descartes. O Eu de Hume não é simples e fixo, mas um feixe de sensações, de conteúdos da consciência, que estão em fluxo constante e se sucedem rapidamente. A consciência trabalha com uma soma de instantes. O eu só funciona quando temos um ato de presença, de acordo com esse feixe. Quando se morre, o eu se anula.
Essa teoria de fluxo do eu, desenvolvida por Hume pode ser associada com o budismo, que considera a vida uma sucessão de processos físicos e mentais que modificam o ser a cada dia. Também podemos traçar paralelos com o devir de Heráclito. Hume chamou a atenção para o poder fixador da consciência dos hábitos. E mais tarde, o místico Carlos Castaneda fez uma distinção parecida, dividindo a percepção em habitual ou extraordinária.
Hume atribui a origem da representação do eu à imaginação. Existem três princípios de associação das representações: contiguidade espacial e temporal, a de semelhança e a de causalidade. Hume argumentou contra a certeza que se tem do próprio eu e se posicionou contra a certeza que o eu sobreviva à própria morte.
Hume demonstra que não podemos ter certeza de nenhuma teoria a respeito da realidade.
A critica do princípio de causalidade de Hume é famosa. Kant a aceitou. Aliás, Kant disse, nos Prolegómenos a toda metafísica futura, que D. Hume lhe despertou do seu sono dogmático. Ao ouvirmos uma voz, supomos que ela tem dono. É a relação causa e efeito. Na primeira vez que isso acontece associamos a voz ao dono. Posteriormente usamos essa associação em qualquer experiência semelhante. Assim, estão ligados a causalidade e a indução. Existe uma associação entre o anterior e o posterior. Como no tempo um fenômeno se sucede a outro, pode se concluir que eles estão ligados. Hume diz que essa ligação não provém da razão. O fato de esperarmos certos efeitos de alguns fenômenos, seja por hábito ou por observação demonstrativa, faz com que vejamos a natureza de determinada maneira. Para garantir sua sobreviência, o homem coloca ordem nas coisas. Dá preferência ao útil. A base das ciências naturais para Hume é irracional. A natureza sobrepõe-se à razão. Ser filósofo, na consequência final, é renunciar ao racionalismo. O princípo causal tem origem na experiência. Temos a mente formatada pelo costume e experiência. Aceitamos uma coisa como natural, mas se fosse de outra maneira, aceitaríamos da mesma forma, como por exemplo controlar a força que dá vida e faz com que cada ser perceba de um jeito. Se isso fosse natural, todos aceitariam como lei da natureza. As leis da natureza surgem assim.
Mas Hume admite a existência objetiva dos efeitos da natureza. Mesmo um cético tem que aceitar a existência de um corpo. Mas as verdades das leis da natureza são apenas as mais prováveis de acontecer. A causalidade não é objetiva, pois nem sempre as mesmas causas produzem o mesmos efeitos. A certeza deve ser substituída pela probabilidade. A expectatica que um evento ocorra é humano, não está na coisa em si.
Hume não acreditava em milagres porque nunca havia visto um. Mas também não dizia que eles não existiam. A origem da religião é o sentimento, assim como a da moral. É temperando o lado prático, sentimento, temor e esperança, que criamos a fé e os deuses. Moralmente aceitos, os princípios céticos são os mais úteis e agradávis para a maioria. As verdades morais não são eternas. Hume coloca questão do que é o bem para o homem . Sua teoria moral tem um tom altruístico.
Em algumas passagens Hume fala do Ser supremo, bondoso , justo e severo, senhor da mãe natureza. Apesar de seu ceticismo não era ateu, como muitos dizem.
Fichamento do livro Ensaios Morais, Políticos e literários
Num dos Ensaios Morais, políticos e literários, O Epicurista, mr. D. Hume fala que o homem aspira à perfeição da natureza com a arte, que a inspira. Ele critica a felicidade artificial, forçada, contrapondo a ela o delito dos sentidos. Alguns chamam Hume de sensualista. Ele citica os sábios, o caminho da felicidade vem de dentro, não de teorias. É nesse caminho que atingimos o prazer. O prazer é irmão da virtude, e ele traz junto consigo os amigos do narrador. E com os amigos a descontração vem. Outro personagem é a sorridente Inocência. A linguagem é jovial, para a frente, enaltece o arrebatamento. É a relação com os epicuristas, e sua doutrina de prazer.
No ensaio seguinte, O Estóico, Hume continua louvando a natureza, essa benevolente mãe de todos. Contrapõe a civilidade à bárbarie, dizendo que devemos apurar nosso gosto pelas artes. A natureza foi gentil com os humanos, pois ele é superior aos animais, mas ele deve buscar a civilidade através da educação, e a competência. Um bom prazer é do trabalho honesto. A indolência gera cansaço. Devemos apefeiçoar o espírito e refletir. Quando acharmos regras para nossa conduta, seremos filósofos, quando aplicarmos elas na prática, seremos sábios.
No Ensaio O Platônico, Hume fala da diversidade dos gostos humanos. Evoca uma bonita imagem, dizendo que os humanos são regatos que tiveram origem no Oceano, Deus, e para lá querem voltar. Fala da contemplação dos filósofos, que deve se voltar para a perfeição e beleza do universo. Os obstáculos para isso estão nas pessoas, entre eles a brevidade da vida.
No ensaio O cético, Hume fala que não podemos recorrer às fórmulas filosóficas para o prazer, sendo infinita a gama de variações das perspectivas humanas. Sendo assim, o único princípio certo da filosofia é que as coisas em si não tem as qualidades que os humanos lhes propõe. Hume volta a falar que é uma impressão de cada um essas qualidades. A paixão é o que atribui valor  aos objetos e aos seres. O homem experimenta um deleite ao observar os objetos tomados em si, que traz um sentimento, levando-o a classificar o objeto como bonito ou feio, desejável ou odiável. Os homes são iguais , e toda diferença entre eles reside na paixão ou fruição.
Hume lamenta o fato de muitos terem aspereza de espírito. A filosofia corrige isso. Apesar de ser para poucos, leva ao prazer.
O mal deriva da ordem do universo, que apesar de ser perfeito, engloba-o. Devemos, para escapar ter na vista as misérias e infortúnios da natureza, nos prevenir, e conhecer os males.
No Ensaio Da Origem do Governo, Hume fala que na sociedade tradicional, uma pessoa nascida em família tem que conservar essa sociedade. Isso é necessário para a distribuição da justiça, que é o principal motivo da existência do governo.
A natureza humana tem seu lado maligno, que vai contra a justiça, sendo necessário a paz e a ordem para conservar a sociedade. Por causa desse lado do homem, é preciso criar encargos para garantir a obediência, um dever.
Os homens do governo tem de ter em si valores que sirvam de exemplo. Uma vez garantida a obediência, através dos hábitos, os homens aprendem a aceitar sem questionar. O governo tem uma origem acidental, como por exemplo a liderança numa guerra. Em todo o governo existe o conflito entra autoridade e liberdade. Esse conflito resulta numa ordem mediana entre os dois, que nunca podem ser absolutos.
No ensaio Do contrato Original, Hume defende a origem divina do governo, dizendo que esse é necessário para a raça humana e foi desejado pelo Ser bondoso e Onisciente. O contrato original nasce do consenso entre um povo. Hume diz que o vigor dos membros e a coragem são a força natural de um homem. A obediência, depois de ser consolidade através de gerações, é aceita como natural. A autoridade estabelecida surge de um ato de razão.
Um chefe impede a comunicação e o lazer e se mantém por causa da ignorância do povo. Assim foram fundados os governos, baseados no contrato original. Hume fala que a disposição política das terras está em constante mudança, através da violência. E pergunta: Onde está o acordo mútuo? Então ele analisa as eleições. Hume fala que em Atenas ocorreu a maior democracia e  entanto, o voto era limitado. Hume defende a idéia de que o governo não tem origem no consenso popular, como havia dado a entender, mas esse consenso nasce da força. A utopia da justiça é impossível pela natureza humana. O fluxo da vida torna necessário uma passagem de valores hereditariamente.
Há duas espécies de deveres morais. Na primeira, o que determina é o instinto, a propensão natural, como o amor pelas crianças. A segunda espécie não se origina por instinto. Elas derivam da obrigação, são necessárias para termos a sociedade. O sentido da justiça e a lealdade derivam da segunda espécie.
Depois de refutar as origens filosóficas e religiosas do governo como consenso popular, Hume investiga o porquê da submissão no Ensaio Da Obediência Passiva. A justiça deve ter utilidade pública. A lei deve buscar a segurança do povo. Hume critca a monarquia chamando esse partido de arrogante. Ele analisa a política da sua época, mas mantém a imparcialidade. Hume defende o Direito de resistência á tirania.
No Ensaio Dos primeiros princípos do governo, Hume fala que é motivo de admiração fato de muitos abdicarem de seus sentimentos em favor de poucos. A opinião pode ser de interesse ou de Direito. A opinião de interesse deriva do benefício do governo..
O Direito pode ser ao poder e a propriedade (lembre-se que Locke defendeu o direito à propriedade como natural). O direito ao poder predomina. Essas opiniões são importantes para o governo, mas o interesse pessoal, o medo e a afeição pode limitá-las.
No Ensaio Da Sucessão protestante, Hume analisa a sucessão hereditária, citando alguns políticos ingleses da sua época. Diz que a monarquia protege o povo e mantém a liberdade. Em ensaios anteriores , seu parecer a monarquia não era favorável.
Os governos absolutos dependem da sua administração . Hume fala que se pode dizer que o governo hereditário dos princípes , uma nobreza sem vassalos e um povo escolhendo seus representantes são a melhor coisa da monarquia , aristocracia e democracia. Mas questiona se as fórmulas gerais da política podem ser efetivas. no Ensaio Que a política pode ser transforamada em ciência. Hume comenta Maquiavel, dizendo que parte de sua teoria tem base falsa. Uma constituição pode ser considerada boa se fornece remédio contra a má administração.
No Ensaio Da liberdade Civil, Hume fala que as pessoas livres de preconceitos, se dedicam a questões partidárias e poltícas, contribuem para a utilidade pública. Mas todos são demasiados jovens e não há fórmula aceitável. Hume fala de Maquiavel, diz que ele era um gênio, mas que as experiências posteriores refutaram suas teorias .
Hume identifica a mudança que se dá no Estado devido ao poder da instituição. É quando se passa de um governo de homens para um governo de leis.
Hume gostava do filosófo pré socrático Xenofonte, e busca nele informações históricas diversas vezes.
No Ensaio Idéia de uma República Perfeita, Hume coloca a problemática de que não é fácil mudar um governo, mesmo que seja para melhor. Ele fala das teoóricos que fizeram planos imaginários de governo, como Thomas More e Platão.
Hume esboça um sistema de governo com o senado, o condado e representantes. Ele fala dos poderes Executivo e Legilativo, necessários para o equilíbrio.
Hume coloca que o espírito humano se contenta, acha natural, a unanimidade de opiniões e fica perturbado com as opiniões diferentes. Ele critica o clero pelo maior uso do poder, que levou à violência. Quando o cristianismo surgiu, a filosofia já estava adiantada. Os cristãos fizeram um sistema de opiniões especulativas e explicaçõesreligiosas que levam ao debate de fé e ao fanatismo. Hume fala que os padres são contra a liberdade.
David Hume mantém moderação entre as disputas que comenta: a dos partidos ingleses. Pretende ver cada ponto de vista e encontrar um meio termo. Ele fala dos Tudor e dos Stuart. A força do governo vem da prática.
No ensaio Da Superstição e do Entusiasmo, Hume fala que a supertição e o entusiasmo são exemplos falsos de religião. A alma humana pode alcançar um estado de espírito negativo, e criar objetos imaginários, atribuindo poderes a coisas inexistentes.
Outro tipo de estado de espírito leva ao entusiasmo. Nele, a imaginação flui. O mundo material, mortal , perde sua grandeza. O arrebatamento toma conta. Atribue-se a origem dele a Deus. Hume diz que a esperança, o orgulho, a presunção e a imaginação são a fonte do entusiasmo. Ele volta a criticar os padres, dizendo que estes se tornam tiranos.
No ensaio Da Origem e progresso das artes e ciências, Hume chama a atenção para a distinção que deve ser feita entre o que é ao acaso e o que provém da causa. O que depende de poucos vem do acaso e ao contrário vem das causas. Na história da arte e da ciência, deve se ter cautela para não confundir as causas, ou achar causas inexistentes.
A arte e a ciência surgem apenas em um governo livre. Um empregado nunca acharia seu patrão um herói. Estados vizinhos e independentes devem ser ligados pelo comércio e política. As críticas vem de outras nações, como os erros de Descartes e críticas a Newton vieram de países vizinhos, enquanto eram aceitos pelos seus conterrâneos. Hume defende mais uma vez a República, dizendo que é o melhor regime para o florescimento artístico e científico, ou seja a república é um Estado livre.
Hume fala que o homem é superior a mulher, mas a natureza proveu todas as espécies de amor entre os sexos, mesmo que seja por pouco tempo.
No ensaio Da eloquência, Hume coloca que certos sentimentos nascidos da vaidade são a o origem das disputas. Ele elogia os oradores gregos e romanos, como Demóstenes.
Nesses ensaios Hume defende um ponto, que a natureza humana tem seu lado maligno e que o preconceito destrói a capacidade de raciocínio, sendo a arrogância um defeito comum. Deus é o ser Supremo, deseja o bem. Então experimentamos as sensações puras. Na civilização tais sensações são pervertidas pelos defeitos que Hume cita. Esses defeitos comuns afastam Deus. Mas há homens com gosto delicado, e eles são superiores.


Razão iluminista

      Em termos gerais podemos dizer que iluminismo é "A linha filosófica caracterizada pelo empenho de estender a crítica e o guia da razão em todos os campos
17 da experiência humana" (ABBAGNANO, 1962, p. 509). O próprio Kant no Prefácio à primeira edição da Crítica da razão pura, define a sua época como de crítica:
      A nossa época é por excelência uma época de crítica à qual tudo deve submeter-se. De ordinário, a religião, por sua santidade, e a legislação, por sua majestade, querem subtrair-se a ela. Mas neste caso provocam contra si uma justa suspeição e não podem fazer jus a uma reverência sincera, reverência esta que a razão atribui exclusivamente àquilo que pode sustentar-lhe o exame crítico e público. (KANT, 2005a, p. 15).
      A filosofia iluminista possui uma confiança decidida na razão humana, propõe um despreconceituoso uso crítico da razão voltada para a libertação em relação aos dogmas metafísicos, aos preconceitos morais, às superstições religiosas, às relações desumanas e tiranas políticas, os quais representam para os iluministas heteronomia. A libertação dessas heteronomias por meio do uso crítico da razão possibilitaria experiências de autonomia.
      A definição dada por Kant ao iluminismo
18 talvez seja a mais conhecida e para esse trabalho é com certeza a mais elucidativa:
      Esclarecimento [Aufklärung] é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a causa dela não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere aude! Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do esclarecimento [Aufklärung]" (KANT, 2005c, p. 63-64).
      É bom lembrar que embora Kant seja um iluminista, ele se afasta do iluminismo em aspectos essenciais, que serão esclarecidos ao longo do capítulo. Fica claro a partir da citação acima, que em Kant o Aufklärung, significa mais que conhecer simplesmente, acima de tudo, significa a realização de sua filosofia prática, que busca a moralização da ação humana através de um processo racional. Segundo Rouanet (1987, p. 209) o lema Sapere aude (ouse saber) refere-se à razão em seu sentido mais amplo, não exclusivamente à razão científica. O Aufklärung implica na superação da menoridade, que é uma condição de heteronomia, requer a decisão e a coragem de servir-se de si mesmo, ou seja, de servir-se de sua própria razão para pensar por conta própria, e guiar-se sem a direção de outro indivíduo. Segundo Mühl (2005, p. 309), o princípio fundamental da pedagogia kantiana está relacionado à palavra Aufklärung, o esclarecimento, dado pelas luzes da razão, "possibilita o indivíduo abandonar a ignorância, permitindo sua ascensão a um nível superior de cultura, educação e formação" (idem). Kant alerta que é difícil para um homem desvencilhar-se da menoridade quando ela se tornou para ele quase uma natureza (cf. KANT, 2005c, p. 64). Mesmo assim, para que tal ocorra, nada mais se exige a não ser liberdade de fazer uso público da razão em todas as questões (cf. idem, p. 65). Kant (ibid, p.66) entende como uso público da razão aquele que qualquer homem, enquanto sábio, faz dela diante do grande público letrado, todavia, entende como uso privado aquele que qualquer homem pode fazer de sua razão em um cargo público ou função a ele confiado. A liberdade de fazer uso público da razão é necessária para que possa haver autonomia de pensamento (pensar por conta própria), autonomia da ação e também autonomia da palavra.
      A filosofia iluminista é otimista porque acredita no progresso por meio do uso crítico e construtivo da razão. No entanto, a razão não é mais um complexo de idéias inatas dadas antes da experiência nas quais se manifesta a essência absoluta das coisas. A razão não é um conteúdo fixo, mas muito mais uma faculdade que só se pode compreender plenamente em seu exercício e explicação.
      Em suma, os iluministas têm confiança na razão - e, nisso, são herdeiros de Descartes, Spinoza ou Leibniz -, mas, diversamente das concepções desses filósofos, a razão dos iluministas é aquela do empirista Locke, que analisa as idéias e as reduz todas à experiência. Trata-se, portanto, de uma razão limitada: limitada à experiência e fiscalizada pela experiência. A razão dos iluministas é a razão que encontra o seu paradigma na física de Newton, que não aponta para as essências, não se perguntando, por exemplo, qual é a causa ou a essência da gravidade, não formulando hipóteses nem se perdendo em conjecturas sobre a natureza última das coisas, mas sim, partindo da experiência e em contínuo contato com a experiência, procura as leis do seu funcionamento e as submete à prova. (REALE, 1990, p. 672).
      Portanto, a razão iluminista é uma razão independente das verdades religiosas e das verdades inatas dos racionalistas. Assim, a noção de autonomia iluminista se refere a uma razão que se dobra a evidências empíricas e matemáticas.
      O iluminismo proclama tanto para a natureza quanto para o conhecimento o princípio da imanência. A natureza e o espírito são concebidos como plenamente acessíveis, não como algo obscuro e misterioso.
      Para descobrir essa lei devemos abster-nos de projetar na natureza as nossas representações e os nossos devaneios subjetivos; devemos, pelo contrário, acompanhar o seu próprio curso e fixá-lo pela observação, experimentação, medida e cálculo. Mas os nossos elementos de mediação não devem basear-se somente em dados sensíveis, devem decorrer igualmente a essas funções universais de comparação e de contagem, de associação e distinção, que constituem a essência do intelecto. Assim, à autonomia da natureza corresponde a autonomia do entendimento. Num só e mesmo processo de emancipação intelectual, a filosofia iluminista procura mostrar a independência da natureza ao mesmo tempo que a independência do entendimento. (CASSIRER, 1997, p. 74-75).
      No discurso dos iluministas, natureza e razão aparecem em relação constante. Segundo Hazard (sd, p. 95), "a natureza era racional, a razão era natural, acordo perfeito". Dessa forma, para os iluministas, o conhecimento físico tinha potência quase ilimitada, inclusive como possibilitador de autonomia para o homem. Para eles, o homem não se reduz à razão, mas tudo pode ser investigado por meio da razão: princípios do conhecimento, a ética, as instituições políticas, os sistemas filosóficos, as crenças religiosas, sistemas educacionais. O homem autônomo para o iluminismo, diferentemente do que para Kant, é esse homem imanente, que por meio de sua razão pode a tudo submeter à investigação científica.



Burguesia e iluminista

As sociedades dos Estados absolutistas eram formadas por diversas classes sociais, dentre as quais eram dominantes a nobreza e a burguesia.
O Estado absolutista alimenta-se do conflito entre essas classes sociais, procurando administrá-lo para preservar uma situação de equilíbrio de forças entre elas. Tirando o máximo proveito dessa coexistência de forças, garantia o poder supremo da monarquia. Isso explica certas contradições do Estado absolutista, como, por exemplo, conceder monopólios de comércio à burguesia, estimular as atividades comerciais e, ao mesmo tempo, oferecer pensões para sustentar uma nobreza cortesã, parasitária e improdutiva.
Com o desenvolvimento do capitalismo, nos séculos XVII e XVIII, a burguesia continuou sua ascensão econômica em importantes países europeus, como Inglaterra e França. Consciente de seus interesses, passou a criticar o Antigo Regime.
As principais características que marcaram as sociedades do Antigo Regime foram:
I. no setor político: poder absoluto dos reis;II. no setor social: divisão da sociedade em estamentos, onde se distinguiam ordens privilegiadas pelo nascimento e camadas desfavoráveis.III. no setor econômico: coexistência de relações feudais e relações capitalistas, ora em harmonia, ora em conflitos;IV. no setor cultural: a intolerância religiosa e filosófica. O Estado e a Igreja intervinham na vida das pessoas, não permitindo a liberdade de religião ou convicção filosófica e política.
Burguesia e Iluminismo
Ao criticar o Antigo Regime, a burguesia foi desenvolvendo sua própria ideologia, baseando-se no seguinte argumento:
I. o Estado só é verdadeiramente poderoso se for rico;II. para enriquecer, ele precisa expandir as atividades capitalistas;III. para expandir as atividades capitalistas é preciso dar liberdade e poder à burguesia.
Foi esse argumento burguês que, investindo implicitamente contra os privilégios da nobreza corroeu, aos poucos, o equilíbrio de forças sociais do Estado absolutista e do Antigo Regime. Ao mesmo tempo, propriciou o surgimento do movimento cultural que ficou conhecido com Iluminismo (também denominado Ilustração ou Filosofia das Luzes).
O que o Iluminismo defendia
Segundo o sociólogo Lucien Goldman, os princípios do Iluminismo estão relacionados ao comércio, uma das principais atividades econômicas da burguesia.
Assim, o Iluminismo defendia:
I. Igualdade: no comércio, isto é, no ato de compra e venda, todas as eventuais desigualdades sociais entre compradores e vendedores não tinham importância. Na compra e venda, o que importava era a igualdade jurídica dos participantes do ato comercial. Por isso, os iluministas defendiam que todos deveriam ser iguais perante a lei. Ninguém teria, então, privilégios de nascença, como os da nobreza. Entretanto, a igualdade jurídica não significava igualdade econômica. No plano econômico, a maioria dos iluministas acreditava que a desigualdade correspondia à ordem natural das coisas.II. Tolerância religiosa ou filosófica: na realização do ato comercial, não importavam as convicções religiosas ou filosóficas dos participantes do negócio. Do ponto de vista econômico, a burguesia compreendeu que seria irracional excluir compradores ou vendedores em função de suas crenças ou convicções pessoais. Fosse mulçumano, judeu, cristão ou ateu, a capacidade econômica das pessoas definia-se pelo ter e não pelo ser.III. Liberdade pessoal e social: a atividade comercial burguesa só poderia desenvolver-se numa economia de mercado, ou seja, era preciso que existisse o livre jogo da oferta e da procura. Por isso, a burguesia se opôs à escravidão humana e passou a defender uma sociedade livre. Afinal sem trabalhadores livres, que recebessem salários, não podiam haver mercado comercial.IV. Propriedade privada: comércio só era possível entre os proprietários de bens ou de dinheiro. O proprietário podia comprar ou vender porque tinha o direito de usar e dispor livremente de seus bens. Assim, a burguesia defendia o direito à propriedade privada, que característica essencial da sociedade capitalista.
O que o Iluminismo combatia
A nova mentalidade burguesa, expressa pelos princípios iluministas, chocava-se com o Antigo Regime. Assim, o Iluminismo combatia:
I. o absolutismo monárquico: porque protegia a nobreza e mantinha seus privilégios. O absolutismo era considerado injusto por impedir a participação da burguesia nas decisões políticas, inviabilizando a realização de seus idéias;II. o mercantilismo: porque a intervenção do Estado na vida econômica era considerada prejudicial ao individualismo burguês, à livre iniciativa e ao desenvolvimento espontâneo do capitalismo;III. a autonomia intelectual: defendia pelo individualismo e pelo racionalismo burguês. Assim, à burguesia não interessava apenas a religião. Ela desejava o avanço da ciência e das técnicas, que favoreciam os transportes, as comunicações, a medicina, etc.




Immanuel Kant

Segundo Gilles Deleuze (entrevista de 1988/89), Kant criou um sistema de juízo. A partir dele, estabelece-se o tribunal da Razão, muito na esteira das ideias da Revolução Francesa (seria interessante estudar a influência da virtude republicana, tal como a entendia Robespierre, por exemplo, no racionalismo kantiano).
Depois dos filósofos terem procurado eliminar o erro, a ilusão e a estupidez (bêtise), nos séculos anteriores, Kant encontrou, finalmente, um método da razão se certificar a si mesma.
Este trabalho de rigorosa depuração (e demarcação) ia muito para além da lógica e permitiu delimitar o campo científico, que se pôde desenvolver no quadro dum novo realismo.
Compreende-se o que esse progresso teve de deixar de fora, e como chegamos à teoria do homem "unidimensional" que está por detrás das ideias económicas em voga no Ocidente.
Por isso, o esforço de Deleuze era no sentido de escapar ao tribunal de Kant. E isso vê-se nas teses imanentistas do "Anti-Édipo" que escreveu com Félix Guattari nos anos setenta.
Mas é caso para perguntar se essa via não condena definitivamente a liberdade.



A teoria  kantiano



A modernidade (e com isso também a pós-modernidade) é marcada pelo fator subjetivista, do sujeito, do indivíduo. Herança essa dada pelos humanistas da época do Renascimento, que, ao fazerem uma nova releitura da realidade, saem da questão teocêntrica da Idade Média e entram no antropocentrismo. Este caminhará por toda a Idade Moderna, contexto histórico, cultural e filosófico ao qual se encontra inserido Immanuel Kant.

Alemão do século XVIII, Kant compartilha dos ideais iluministas de sua época. Ideais cujas forças se dão na primazia da razão, na razão do sujeito. No duelo entre racionalistas, que já trazem o dado da racionalidade, mas ainda não se desvencilham do objeto, e empiristas, cuja tese do conhecimento só se torna possível por que há o contato com o objeto, Kant tira o sujeito agente do conhecimento da órbita e o coloca no centro, como fez Copérnico com a astronomia quando provou que era a terra que girava em torno do sol e não o contrário. A teoria de Kant é assim chamada de revolução copernicana do conhecimento.

A teoria do conhecimento kantiana é expressamente modernista. Nela percebe-se o quanto o sujeito do conhecimento é centro de toda a especulação gnosiológica. O dado da experiência é extremamente importante, contudo. Kant não descarta o dado empírico assim como não descarta a possibilidade racionalista, mas as une, as sintetiza. Junta os juízos sintéticos a posteriori do conhecimento empírico e os juízos analíticos a priori do conhecimento racionalista. Nascem, então, os juízos sintéticos a priori e o idealismo transcendental kantiano.




alunos : leticia esmeralda , vanessa , mairla .